(Ez 17,22-24; Sl 91[92]; 2Cor 5,6-10; Mc 4,26-34)
1.
Na celebração da tarde do domingo anterior, falávamos sobre o significado do
‘Reino de Deus’. Este não pode ser entendido com base em nossas categorias de
domínio e de poder. O Reino não é fundamentalmente uma situação nova e melhor
ou simplesmente um lugar de felicidade.
2.
Há quem entenda o Reino anunciado por Jesus como a acolhida livre do ser humano
de Deus como Absoluto, o valor maior da vida de alguém. É a partir daí que ele
abre os olhos para a dimensão exata de cada realidade, entende o verdadeiro
valor das coisas e estabelece com elas um relacionamento adequado.
3.
Em nosso evangelho Jesus parte da botânica, falando do processo de
desenvolvimento da semente e, particularmente, do grão de mostarda, que embora
minúscula, não é a menor das sementes que se conhece. Mas para os ouvintes de
Jesus ela significava algo pequeno, uma quantia mínima.
4.
Mas mesmo sendo tão pequena, ela é ativa. Em um ano ela chega a mais de um
metro e pode chegar a três ou quatro metros de altura a depender da região.
Fixemo-nos nessa 1ª indicação importante: Deus escolhe a realidade mais humilde
para realizar o seu desígnio de grandeza.
5.
Mas toda a ‘operação’ deve ser atribuída exclusivamente a Ele. O Reino é obra
exclusiva de Deus. E aqui vem também anulada qualquer ideia de domínio e de
conquista para dar espaço a aquela de refúgio e proteção: “os pássaros podem
abrigar-se à sua sombra...”.
6.
Na parábola do semeador, os pássaros aparecem como uma ameaça pois comem as
sementes. Mas aqui eles são hospedados. Nesta perspectiva, os inimigos resultam
vencidos não porque são exterminados, mas porque são ‘acolhidos’.
7.
Nós passamos ao lado de uma mata ou plantação e contemplamos todo esse processo
com algo normal, que obedece às leis biológicas. Para o homem da Bíblia
trata-se de uma série de milagres. Assim sendo, a parábola nos diz que o
crescimento do Reino é algo de prodigioso, como ação de Deus, não controlado
pelo ser humano.
8.
Há quem confunda o Reino de Deus com o desenvolvimento e a difusão da Igreja. O
Reino certamente é operante na terra e na Igreja, mas ele não é uma dimensão
visível e uma instituição exterior como a Igreja em si. Não pode ser
interpretado a partir de uma manifestação externa de grandeza, de extensão de
influência, sucesso...
9.
E assim entramos no terreno do contraditório: O Reino é pouco aparente, mas
presente e operante. De pouca influência, mas determinante; supérfluo, mas
necessário. Vemos isso na própria hesitação de Jesus na busca de uma
comparação.
10.
É como se o Reino fosse planta e semente ao mesmo tempo, porque ele, mesmo
quando uma planta já crescida, não deixa de ser semente.
11.
Essa parábola de Jesus não nos projeta ao futuro, mas nos faz atento ao
presente. A humildade da imagem da semente não deve soar como algo sem
importância. Desprezar as coisas que parecem sem importância pode trazer
consequências incalculáveis. Transcurando o cotidiano, perdemos esse encontro
com o Reino.
12.
O Reino está nas coisas familiares. No ato de compartilhar o pão, um sorriso,
um gesto de solidariedade, um olhar de simpatia, uma amizade, de colocar-se ao
lado do mais frágil, de abraçar uma ‘causa perdida’, uma porta aberta, um prato
a mais na mesa... coisas que traduzem uma presença, uma escolha.
13.
A árvore do nosso Evangelho permite que os pássaros encontrem abrigo. Sua
importância não se mede pelo tamanho, mas pela quantidade de ninhos permitidos.
São eles que revelam sua importância. Em outro momento o Evangelho nos dirá que
são os frutos que falam da árvore. Há quem aprecie uma boa sombra.
Pe.
João Bosco Vieira Leite