Terça, 30 de abril de 2019


(At 4,32-37; Sl 92[93]; Jo 3,7-15) 
2ª Semana da Páscoa.

“Nicodemos perguntou: ‘Como é que isso pode acontecer’?” Jo 3,9.

“Não se pode falar do renascimento como se fala de um comportamento externo ou de algo visível. É uma coisa celeste. Somente aquele que esteve nos céus e desceu até nós pode informar realmente sobre a origem da nossa existência. Jesus é o verdadeiro mestre que nos instrui sobre a origem celeste de nossa vida, que nos revela de onde vem a nossa existência. Eu não posso responder realmente nem à pergunta pela origem nem à pergunta pelo como. Mas, pelo simples fato de formular essas perguntas, livro-me das amarras que me prendem a meus problemas. O fato de perguntar já tem um efeito salvífico. A pergunta mostra que sou um mistério para mim mesmo. Meu verdadeiro ser tem uma origem celeste. Não consigo descrevê-lo com termos da terra, assim como não consigo apreender o vento em si. Sabendo do mistério do meu eu espiritual, paro de dar voltas em torno de coisas superficiais. É como um novo nascimento. Já não sou dominado pelo eu que gira em torno de si mesmo, e sim pelo verdadeiro eu próprio em que se imprimiu a imagem de Deus e que se furta a todo conhecimento humano” (Anselm Grun – Jesus: porta para a vida – Loyola).

 Pe. João Bosco Vieira Leite

Segunda, 29 de abril de 2019


(At 4,23-31; Sl 2; Jo 3,1-8) 
2ª Semana da Páscoa.

“Havia um chefe judaico, membro do grupo dos fariseus, chamado Nicodemos” Jo 3,1.

“Nicodemos é um judeu religioso preocupado com a questão da salvação. O que fazer para que a vida humana seja bem sucedida, salva e completa não é apenas uma inquietação tipicamente grega. No fundo trata-se de uma questão que comove todo ser humano em qualquer época. Nicodemos procurou Jesus de noite. Em João, as horas estão sempre cheias de simbolismo. A noite representa a escuridão e as trevas interiores, o obscurecimento da mente. Atormentado pela absurdidade, Nicodemos vai a Jesus para encontrar uma resposta para as suas perguntas existenciais. Mas ele esconde a sua pergunta atrás da constatação de que Jesus certamente vem da parte de Deus. Nicodemos sente que há nesse homem algo que o distingue dos demais mestres que falam de Deus, mas não são de Deus. Jesus percebe o que o autor da pergunta está querendo saber realmente. E antes de Nicodemos formular a sua pergunta, Jesus expressa uma proposição que vai ao âmago do verdadeiro problema do interlocutor: ‘A menos que nasça de novo (ou, do alto= ‘anothen’), ninguém pode ver o Reino de Deus’ (3,3). Certamente, o duplo sentido da expressão foi escolhido de propósito. Só quem nasce do alto, de Deus, pode ver o Reino de Deus e salva sua vida. Ele é arrancado do mundo das aparências. O mundo não tem poder sobre ele com suas demandas e expectativas. Mas não se trata apenas da origem dupla do ser humano, nascimento ao mesmo tempo da terra e de Deus. Aqui está sendo abordado também o tema do nascimento. [...] Hoje em dia, quando houve falar do renascimento, muita gente pensa logo em reencarnação, ou seja, numa nova encarnação depois da morte. Mas não é nisto que se pensa aqui. Para João trata-se da essência do ser humano. E esta é determinada por sua origem. A verdadeira essência do ser humano é ter nascido de Deus. Mas, isso não quer dizer apenas que o homem é criado por Deus. Quem nasceu da carne é alienado segundo a sua verdadeira natureza. Ele não se entende a si próprio. Vive por viver. Bultmann entende o renascimento do espírito como um ‘modo de ser que o homem está dentro da sua própria autenticidade, compreendendo-se, sem sentir-se acuado pela nulidade’ (Bultmann, 1950, p. 100)”. (Anselm Grun – Jesus: porta para a vida – Loyola).

Pe. João Bosco Vieira Leite

2º Domingo da Pascoa – Ano C


(At 5,12-16; Sl 117[118]; Ap 1,9-11a.12-13.17-19; Jo 20,19-31)

1. Nesse breve relato que abre a nossa liturgia da Palavra, vemos como a Igreja cresce na sua ação dando continuidade ao projeto de Jesus de cura e libertação, graças à sua Páscoa. Mesmo em nosso tempo, aspectos desse início continuam atuando ainda que não percebamos.

2. Assim tem razão o salmista ao cantar a misericórdia divina que nos alcança pelo mistério pascal. Enquanto isso, João vive outra experiência dentro desse mistério. Mesmo isolado de sua comunidade, experimenta profunda comunhão com Deus, assim temos um breve retrato de aspectos diferentes de um mesmo mistério.

3. Os acontecimentos do dia da ressurreição se encerram com essa aparição de Cristo aos seus discípulos. A presença do Ressuscitado desconhece paredes, para entrar, mas respeita o coração humano, nas suas dificuldades para crer.

4.  A dificuldade de crer de Tomé tem na sua ausência da comunidade um grande peso. Mesmo com toda dificuldade que esse viver comunitário apresenta, ela é um sustento para nossa vida de fé.

5. Esse sentido de pertença e participação, que pode cair numa espécie de formalismo, devem ser marcados não tanto pelo serviço que prestamos na comunidade, mas pela presença do Senhor ressuscitado que buscamos continuamente.

6. “Sim, é o olhar de fé que é preciso purificar, todas as vezes. Melhor, o que já se conhece, o habitual, com o risco de se tornar ultrapassado, pode ser incentivo para ir mais além e procurar o essencial. E inclusive as limitações (qual é a comunidade que não as tem?) tornam-se pretexto que atrai o Senhor para junto dos seus: medos e pecados, hesitações e fechamentos, incredulidades e lentidões... e muito mais ainda. É no Cenáculo da comunhão que Jesus ressuscitado se torna presente, mais forte que qualquer limitação, com a consoladora certeza de que os pecados podem ser perdoados (cf. Jo 20,23)” (Giuseppe Casarin – Lecionário Comentado [Quaresma – Páscoa] – Paulus).

 Pe. João Bosco Vieira Leite

Sábado, 27 de abril de 2019


(At 4,13-21; Sl 117[118]; Mc 16,9-15) 
Oitava de Páscoa.

“Por fim, Jesus apareceu aos onze discípulos enquanto estavam comendo, repreendeu-os por causa da falta de fé e pela dureza de coração, porque não tinham acreditado naqueles que o tinham visto ressuscitado” Mc 16,14.

“Quando andamos por aí encontramos muito cristão triste! Tem até aquele ditado que diz: ‘Um santo triste é um triste santo!’ Parece obvio dizer isto, mas não dá para imaginar alguém que acredita em algo de extrema importância fique assim com aquele jeito amuado de quem está de mal com a vida. A fé dá um ânimo! Que o digam as pessoas que a vivem intensamente! São pessoas brilhantes, encorajadoras, muito otimistas! Pessoas de fé empurram a vida para a frente. Não podemos nem pensar nos companheiros de vida do Senhor, ali, sentados à mesa e brigando por lugar, por precedência, por sobremesa; escolhendo com quem sentar-se para não cruzar com algum desafeto. Às vezes até em grupos religiosos o sentar-se à mesa é cheio daquele silêncio tenso de quem não saboreia a vida que abraçou. Banquete fraterno tem o tempero alegre do gostoso espírito comum. Não é uma reunião de múmias caladas esperando acabar-se em pó. De vez em quando é bom mesmo que venha Jesus para repreender a passividade, a incredulidade, a falta de vitalidade, a esclerose do coração. É bom que ele repreenda, provoque e convoque novamente para fé! A fé faz ver; olhar com os olhos da fé é estar sempre vendo a ressurreição! – Senhor, ajudai-me a ser sempre contente na vida e pela vida que abracei. Amém” (Vitório Mazzuco Filho – Graças a Deus (1995) – Vozes).

Pe. João Bosco Viera Leite

Sexta, 26 de abril de 2019


 (At 4,1-12; Sl 117[118]; Jo 21,1-14) 
Oitava de Páscoa.

“Jesus disse-lhes: ‘Lançai a rede à direita da barca e achareis’. Lançaram, pois, a rede e não conseguiram puxá-la para fora, por causa da quantidade de peixes” Jo 21,6.

“O capítulo 21 é considerado um apêndice. Mas em seu todo ele é inseparável do evangelho de João, pois retoma temas importantes e leva à conclusão. A introdução já faz referência aos acontecimentos narrados anteriormente. Depois da ressurreição, Jesus se manifestou uma terceira vez aos discípulos. Essa terceira vez tem conotação simbólica. Todas as áreas de atuação do ser humano são transformadas pela Ressurreição. A Ressurreição é consumação do amor (Maria de Magdala) e da fé (Tomás), e a Ressurreição é a transformação do nosso dia a dia. Essa afirmação se confirma na cena da pescaria matutina. Os discípulos estão envolvidos em seus afazeres diários, estão pescando. Mas o seu trabalho é infrutífero. É a noite da frustração, uma situação que todos nós conhecemos. Tudo é em vão. Todo o nosso esforço resulta em nada. Estamos decepcionados, acabrunhados. Sete foram os discípulos que saíram para pescar. Eles são a imagem da comunidade da Igreja. A cooperação não funciona. Os resultados não aparecem. Nessa noite da frustração entra Jesus vindo da margem. O ressuscitado entra no nosso mundo diário vindo do mundo divino. E quando ele chega, a manhã cinzenta se transforma: a noite da frustração muda de aspecto. O ressuscitado se dirige aos discípulos perguntando pelo alimento deles: ‘Moços, não tendes um pouco de peixe?’ (21,5). Jesus chama carinhosamente de moços. Até certo ponto são até crianças em seu entendimento, pois continuam não compreendendo quem é esse Jesus. [...] Jesus pergunta aos discípulos por aquilo que os nutre realmente, que lhes dá a vida de verdade. E eles precisam admitir que não têm nada, que suas mãos estão vazias. Jesus lhes mostra, então, como sua vida pode ser bem sucedida. Ele os manda lançar a rede do lado direito do barco. Jesus não exige nada de especial. Devem fazer aquilo que sempre fizeram: lançar a sua rede. Só que devem fazê-lo a mando de Jesus, e do lado direito, que é o lado consciente. Eles precisam ouvir a palavras de Jesus e executar consciente e atentamente os seus afazeres diários. Assim virão. Nos sonhos, pescar significa simbolicamente vasculhar suas próprias profundezas, no seu mundo interior. Os discípulos não devem escarafunchar sem atenção nas profundezas de sua consciência. É preciso aguardar a palavra de Jesus. É esta palavra que os guia para o fundo do seu mar interno, para o fundo de sua alma” (Anselm Grun – Jesus: porta para a vida – Loyola).

Pe. João Bosco Viera Leite
   

Quinta, 25 de abril de 2019


(At 3,11-26; Sl 8; Lc 24,35-48) 
Oitava de Páscoa.

“Ainda estavam falando quando o próprio Jesus apareceu no meio deles e disse: ‘A paz esteja convosco’” Lc 24,36.

“A terceira imagem que Lucas nos desenha do dia da Ressurreição é a aparição de Jesus diante dos discípulos reunidos. Os discípulos de Emaús voltam a Jerusalém, cheios de alegria. Os discípulos e discípulas que tinham ficado contam-lhes que o Senhor realmente ressuscitou e apareceu a Simão. Enquanto ainda falam sobre isso, o próprio Jesus entra no meio deles. Assustam-se e sentem medo, pois pensam que estão vendo um espírito. Jesus mostra-lhes as mãos e os pés: ‘Olhai as minhas mãos e o meus pés: sou eu mesmo. Tocai-me, olhai: um espírito não tem carne e ossos como vós vedes que eu tenho’ (Lc 24,39). Aqui Lucas quer mostrar aos gregos o que significa a ressurreição. Os gregos conseguiram muito bem imaginar que o ressuscitado fosse um espírito, que a alma se tivesse separado do corpo e agora subsistisse em si mesma. Ressurreição, porém, é mais do que isso. Levantou-se a pessoa de Jesus, de corpo e alma. Com referência a mãos e pés, Lucas responde à filosofia platônica, que só conseguia imaginar uma libertação da lama de dentro da prisão do corpo. Ressurreição, porém, é ressurreição do corpo. Ela nos dá mãos que assumem a vida, que tocam nos outros com ternura, que acariciam, fazendo sentir o amor. E a ressurreição nos põe em pé, para que tenhamos firmeza e sigamos o nosso caminho, cada um o seu próprio caminho, que nos leva à vida” (Anselm Grun – Jesus: modelo de ser humano – Loyola).

Pe. João Bosco Vieira Leite

Quarta, 24 de abril de 2019


(At 3,1-10; Sl 104[105]; Lc 24,13-35) 
Oitava de Páscoa.

“Então um disse ao outro: ‘Não estava ardendo o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?’” Lc 24,32.

“Quem de nós não lembra os versos famosos de Camões: ‘Amor é fogo que arde sem ver; é ferida que dói e não se sente; é um contentamento descontente...’? O desespero da poesia em querer dizer o que não consegue trazer à fala: o amor! Quem de nós não cantou pelo cancioneiro popular veros como este: ‘Meu coração, não sei por que, bate feliz, quando te vê!’ ou ‘enquanto a chama arder, todo dia te ver passar’, ou ainda versos como estes: ‘Dizem que o amor atrai’; ‘Não dá mais para segurar, explode coração!’; ‘Lá vem a força, lá vem a magia. Que me incendeia o corpo de alegria. Lá vem a santa, maldita euforia, que me aquece e me faz carinho... É minha, é nossa energia, que vem de longe pra me fazer companhia’. Existe uma verdade nestes versos todos: o amor mexe, sacode, arrepia, posiciona-se, cria um metabolismo; não dá para ficar indiferente na presença da pessoa amada. Se o amor entre os humanos cria esta forte experiência de sentir, eletrizar-se e perceber, quanto mais o amor de Deus caminhando bem ali ao nosso lado! O apóstolo Paulo dizia que é ter os mesmos sentimentos de Cristo, que já não é agente que vive, mas Ele que vive em nós. A Bíblia chama isto de terra prometida. A comunidade cristã viu línguas de fogo na cabeça. E quando as palavras não conseguem mais dizer chamamos toda essa verdade de graça santificante. –Senhor, que a tua presença me incendei de Amor. Amém (Vitório Mazzuco Filho – Graças a Deus (1995) – Vozes).

Pe. João Bosco Vieira Leite

Terça, 23 de abril de 2019


(At 2,36-41; Sl 32[33]; Jo 20,11-18) 
Oitava de Páscoa.

“Mas vai dizer aos meus irmãos: subo para junto do meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus” Jo 20,17b.

“A ressurreição de Jesus é a vitória do bem sobre o mal, de Deus sobre o diabo, do perdão sobre o pecado, da nova vida sobre a velha vida. Com a ressurreição de Jesus, uma nova vida era inaugurada. A era de um relacionamento íntimo e cheio de graça com o Criador. Unicamente pela fé! Após mostrar que havia ressuscitado, Jesus disse para Maria: ‘Vai aos meus irmãos e dize-lhes: subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus’ (Jo 20,17b). Jesus já anuncia a sua ascensão, sua subida aos céus, cheio de glória e poder, deixando-nos no tempo da graça, deixando-nos nesta era de um relacionamento íntimo com Deus e baseado na fé cristã. Aí está a coluna vertebral da fé revelada na Escritura Sagrada. Morte, ressurreição e ascensão de Jesus. Por nós. Para nossa salvação. Para perdão e vida eterna. Para inaugurar o tempo da graça, da reconciliação, do recomeço de vida. Crer na morte, ressurreição e ascensão de Jesus é ter fé no objeto certo, é crer conforme os ensinamentos bíblicos essenciais a respeito do Salvador. É preciso destacar a maneira como Jesus dirigiu-se a Maria: ‘meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus’. Esta é garantia que a morte, ressurreição e ascensão de Jesus nos dá: temos Deus e Pai certos em nossas vidas. Deus e Pai que cuida, também se interessa por nosso viver, enviou o Filho para nossa salvação, envia ainda hoje o Espírito Santo para animar, consolar e fortalecer esta fé cristã. Continue firme nessa confiança a respeito da morte, ressurreição e ascensão de Jesus. Ela nos garante o tempo da graça, da nova era de um relacionamento íntimo com nosso Deus e Pai. Relacionamento baseado na fé em Jesus e manifestado em nosso viver diário. – Senhor Jesus, obrigado por ter morrido e ressuscitado em meu lugar. É garantia do perdão e da salvação. Agora estás no céu. Voltará como Rei para revelar a salvação pela fé. Cuida de mim, Senhor. Amém! (Bruno Arnoldo Kruger Serves – Meditações para o dia a dia [2017]- Vozes).

Pe. João Bosco Vieira Leite


Segunda, 22 de abril de 2019


(At 2,14.22-32; Sl 15[16]; Mt 28,8-15) 
Oitava de Páscoa.

“As mulheres partiram depressa do sepulcro. Estavam com medo, mas correram com grande alegria, para dar a notícia aos discípulos” Mt 28,8.

“Por mais precioso que fosse, o túmulo vazio assim como a cruz vazia teriam que ficar para trás, haviam prestado seu serviço, e agora haviam outras cruzes e sepulturas a esvaziar. Por isso, é preciso correr, dar as notícias aos outros, e repartir a ressurreição com os outros, mesmo que cheias de temor em relação à ressurreição, mas igualmente cheias de renovadas esperanças de vida, para esvaziar o poder das cruzes e dos túmulos que o pecado constrói, para que a mensagem do evangelho renove a fé no ‘eu vivo, vós vivereis também’. Afastar-se do túmulo é uma tarefa imprescindível para quem não deseja um cristianismo meramente contemplativo, ou simples observância de tradições. Lugares e eventos, como a própria cruz e o túmulo, podem ser preciosos aos costumes e tradições cristãs. Mas não servem aos propósitos de Deus. Tanto é verdade que nem a cruz de Cristo foi produzida por Deus, mesmo que servisse aos interesses de Deus em fazer seu Filho sobre ela pagar pelos pecados da humanidade, e nem a sepultura era propriedade de Jesus, Ele que tinha prometido ressuscitar ao terceiro dia, e antes tivesse que necessariamente ser sepultado. Afastar-se do túmulo também e fundamental para escapar da piedosa, mas pueril ingenuidade de querer provar a ressurreição de Jesus, como se a mensagem da salvação tenha que ser provada para os que detêm o poder neste mundo. A notícia da ressurreição precisa ser levada para longe das cruzes e das sepulturas que o poder do pecado produz aqui na terra, e criar a fé que conduz à vida eterna por meio da ressurreição de Cristo. – Senhor, não permita que a cruz e a sepultura, mesmo vazias, transformem a Igreja um simples lugar, mas em cristãos apressados em noticiar que Jesus ressuscitou. Amém” (Augusto Jacob Grun – Meditações para o dia a dia [2015] – Vozes). 

 Pe. João Bosco Vieira Leite


Domingo da Ressurreição


(At 10,34a.37-43; Sl 117[118]; Cl 3,1-4; Jo 20,1-9)

1. Assim como a quaresma, o 1º e o 2º domingo de páscoa nos trazem sempre os mesmos episódios. Maria Madalena, João e Pedro estão no centro da narrativa de hoje. No próximo domingo será Tomé. Tudo para nos falar sobre o caminho que nos leva à fé na ressurreição.

2. Olhemos para nossas personagens de hoje. Maria vê a pedra retirada da entrada do túmulo. Ela não vê sinais da ressurreição, procura uma explicação lógica.

3. Ela convida Pedro e João a certificarem do que ela presumia. João e Pedro admiram-se diante da ordem das coisas dentro do túmulo. Se fosse um roubo do corpo, tais panos não ficariam para trás.

4. João, mais intuitivo, compreende imediatamente: são sinais do que o Senhor havia dito. Ele viu e acreditou, enquanto Pedro somente constata.

5. Nessas três personagens e nas suas atitudes também nos encontramos, particularmente quando as situações se tornam difíceis. Certas pedras não são fáceis de serem removidas, elas insistem em nos fazer tropeçar.

6. Se Maria é mais afetiva, enquanto João é intuitivo e Pedro lento, todos eles e nós temos algo em comum: procuramos os sinais da presença do Senhor.

7. Jesus seria apenas alguém extraordinário, um pensador, um idealista, um sonhador, se não tivesse ressuscitado. A ressurreição é a prova máxima da sua divindade, sua presença entre nós é muitos mais que a simples atualização do seu modo de pensar.

8. Em nossa reunião comunitária, celebramos a cada domingo essa presença, pois partilhamos as experiências da fé em sua ressurreição, ainda que alguns cheguem primeiro e outros depois. Somos atraídos por Ele e sua Palavra orienta a nossa caminhada, por isso cada domingo é Páscoa!

9. A Sua ressurreição é o nosso ponto de partida. Experimentamos processos de passagem em nossa vida: do pecado para vida da graça, da tristeza para a alegria, do sofrimento para superação, da morte para a vida. A nossa vida cristã é um constante navegar nas águas da ressurreição.

10. A ressurreição é também a nossa meta, pois o caminho que fazemos em nossa fé alimenta a certeza da nossa ressurreição. Por isso, num domingo especial, nos lembramos particularmente da nossa identidade.

11. Não importa se o nosso caminhar se pareça ao de Maria, de João ou de Pedro. O importante é movimentar-se, caminhar, buscar, é comunicar nossa experiência, ainda que pequena, ao outro que também segue nessa busca. Há um sopro de esperança que nos move e nos leva a comunica-la. Uma feliz Páscoa para você que, como eu, persegue os sinais da Ressurreição.  

Pe.  João Bosco Vieira Leite

Sábado Santo


(Uma reflexão em torno da afirmação do credo que Jesus ‘desceu aos infernos’ do teólogo Urs Von Balthasar: )

“’Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?’ Como Deus, pode o Cristo na Cruz carregar em si mesmo este ‘inferno’, esta privação de Deus que é uma das consequências possíveis da liberdade humana? A única resposta válida, que o homem entregue a si mesmo não poderia imaginar, é dada quando o Homem-Jesus, o Filho do Deus Vivo, desce aos infernos onde Deus é ausente, revelando assim que a Liberdade absoluta do Deus Criador é de fato o Mistério da Trindade de seu Amor. Esse Filho de Deus, levado pelo livre Amor de Deus, assume como homem a condição mortal da criatura perdida longe de Deus. Ele penetra no ‘lugar’ de que nenhum homem pode esperar salvar-se por suas próprias forças: ‘Vós que entrais, deixai aqui toda esperança’ (Dante). Se assim é, eis que se manifesta em Cristo descendo aos infernos a razão pela qual pode Deus, desde o início, tomar a responsabilidade duma posição entre Ele e o homem, e qualificá-la de ‘muito boa’. Essa posição entre Deus, Criador e Pai, e o homem que arrisca a se perder para sempre depois de ter sido enviado pelo Criador, o Filho; esse vínculo esticado até quase à ruptura não se rompe, porque ambos, Aquele que envia e Aquele que é enviado, Aquele que desceu até aos infernos dos homens, são inspirados pelo mesmo amor absoluto, o Espírito de Deus. Deus deixa o Filho mergulhar na derrelicção, acompanhando-o até lá, graças ao seu Espírito. O Filho pode se afastar de Deus e descer aos infernos porque ele vê nessa inciativa uma maneira de manifestar o seu amor pelo Pai. Ele se mostra de tal modo obediente em seu Amor, que pode assim experimentar a que ponto o Homem perdido é privado de Deus. É necessário que a pura passividade que resulta do amor obediente se deixe precipitar nesta perdição pelo próprio Amor, para que a criatura deixada livre possa ser salva. A morte perdeu seu aguilhão, o Inferno visitado pelo Cristo é vencido: o cristão pode olhar em face a Morte em sua terrível realidade, sem, por isso, renunciar à esperança. Deus entregou seu Filho à perdição, para não abandonar o homem à solidão de sua derrelicção”.  

Pe. João Bosco Vieira Leite

Sexta-feira da Paixão do Senhor


(Is 52,13—53,12; Sl 30[31]; Hb 4,14-16; 5,7-9; Jo 18,1—19,42)

1. A sexta-feira santa sempre nos reserva o evangelho de João, que em sua profundidade teológica/espiritual nos obriga a algum corte no texto para nossa meditação. Tomo alguns pontos do comentário do Cardeal Gianfranco Ravasi à cena da Mãe e do discípulo ao pé da Cruz.

2. Tomemos esse fio de recordação que Maria e João, o discípulo amado, que a tradição identifica como o próprio autor do evangelho, nos deixou daquela hora trágica.

3. Qual o valor deste gesto extremo de Jesus de entregar sua Mãe ao discípulo e o discípulo à sua Mãe? Seria uma preocupação com a sobrevivência de Maria? Ou há um significado mais profundo, revelando-nos uma nova maternidade espiritual de Maria?

4. Segundo os padres da Igreja, tratava-se de uma reafirmação da virgindade de Maria, desprovida de outros filhos a quem confiar-se. Seria Maria um símbolo da Igreja que João deveria cuidar? Ou o contrário? São muitas as interpretações que giram em torno dessa cena.

5. Muitas vezes permitia-se aos parentes, aos amigos e aos inimigos de uma pessoa crucificada acompanhar as últimas horas daquela atroz agonia. Com Maria e João havia outras mulheres, mas o objetivo de João se fixa em dois rostos.

6. O 1º é o de Maria, o 2º é o ‘discípulo amado’. Essa expressão de ‘discípulo que ele amava’ talvez não tenha a necessária intenção de identificar um personagem, mas nos apresentar o retrato do discípulo perfeito, o verdadeiro fiel de Cristo. O título adquire um valor simbólico, como acontece muitas vezes nesse evangelho.

7. O evangelista, sobre a cena que se desenrola aos pés da cruz, quer, portanto, tecer uma imagem ulterior que ultrapassa os confins daquele lugar e daquele dia trágico.

8. Assim, nas palavras que dirige à Mãe e ao discípulo, não estamos perante um simples gesto social, num encargo de cuidados, mas perante a última palavra solene que revela o mistério e o significado último de uma pessoa.

9. Lembremos que o título solene ‘Mulher’, já utilizado por ele em Caná, nesse jogo de alusões do 4º evangelho, nos remete para a mulher que está na origem da história humana, reconhecida como mãe da humanidade inteira; agora Maria torna-se o início de todos os crentes no seu Filho.

10. Maria surge agora em nova função materna, a função de ser mãe de todos os fiéis, símbolo da Igreja que gera novos filhos e irmãos para o Pai e para Cristo e os protege do mal, como a mulher do Apocalipse que escapa do dragão.

11. Ela vive a hora do seu Filho. Tal como Cristo, sofrendo e morrendo gera a salvação, assim Maria, sofrendo e perdendo tudo, torna-se mãe da Igreja. Assim, Jesus apresenta ao discípulo amado, símbolo dos crentes, a sua mãe espiritual.

12. “Dessa hora em diante, o discípulo a acolheu consigo”, diz o texto, mas é mais que uma simples informação. Maria e o discípulo não só terão a mesma residência como viverão em comunhão de fé e de amor precisamente como o cristão acolhe e vive em comunhão profunda com a Igreja sua mãe. Aqui se entrelaçam Mariologia e eclesiologia.

13. Assim concluo com as palavras de um autor que imaginou “A vida de Jesus narrada por sua Mãe”: ‘Também nós, pobres mulheres, deixamos o Calvário com João, que a partir daquele momento me tomou consigo. E nos dias de luto, para me consolar contou-me muitas coisas acerca d’Ele. Também lhe contei aquelas coisas que, desde a sua primeira infância, me tinham acontecido por causa d’Ele, e que eu conservava diligentemente no coração. E conta-las e reconta-las era um modo de continuar a viver com Ele, a viver d’Ele’. Amém.

Pe. João Bosco Vieira Leite

Quinta-feira Santa


(Ex 12,1-8.11-14; Sl 115[116B]; 1Cor 11,23-26; Jo 13,1-15)

1. A 1ª leitura nos apresentou a descrição da celebração da Páscoa praticada por Israel, ao centro dessa ceia celebrativa encontra-se o cordeiro como símbolo da libertação da escravidão do Egito. Toda a liturgia era acompanhada de uma narrativa, um memorial da ação de Deus a favor do seu povo.

2. O importante era não esquecer que Deus tinha assumido pessoalmente a história do seu povo, e que esta história estava continuamente fundamentada na comunhão com Deus. Israel não devia esquecer-se de Deus.

3. O nosso salmo reflete as palavras de agradecimento que inspiravam o louvor e as orações feitas por Israel, mas havia sempre a súplica para que Deus completasse a libertação começada, pois sabemos que Israel viveu contínuas tensões com os povos vizinhos, maiores e poderosos.

4. Os evangelistas sinóticos (Mt, Mc e Lc) nos dão a entender que Jesus celebrou esta ceia com os seus discípulos antes de sofrer a paixão, e nesse contexto inaugurou a nova Páscoa, entregando-nos a Eucaristia.

5. Mas segundo João, autor do evangelho que escutamos nessa noite, Jesus morreu precisamente no momento em que os cordeiros eram imolados no Templo. Assim ele teria morrido na vigília pascal, não tendo celebrado tal ceia. Tanto é verdade que nas narrativas da Ceia não aparecem os elementos da páscoa judaica.

6. A celebração que fazemos memória ocorreu um dia antes, sem o cordeiro tradicional, pois em seu lugar, Jesus entregou-se a Si mesmo, no seu Corpo e no seu Sangue. Assim, antecipou a sua morte de modo coerente com o que havia antes: “Ninguém me tira a vida; sou eu que a dou por mim mesmo” (Jo 10,18).

7. Convergem para o gesto de Cristo as palavras de João Batista, que apresentam Jesus como ‘O Cordeiro de Deus, que vai tirar o pecado do mundo’. Pois um animal não poderia purificar o homem, nem salvá-lo da morte.

8. Ao mesmo tempo Jesus é o Templo de Deus, o templo vivo onde Deus tem sua morada e onde podemos encontrar Deus e adorá-lo. O seu amor, o amor no qual se entrega livremente por nós, é que nos salva.

9. A cruz será o altar da imolação, do dom oferecido. É dela que nos vem o dom. assim a nossa refeição é uma memória que não recorda simplesmente o passado, mas atrai-nos à presença do amor de Cristo, para o hoje da nossa existência.

10. Que o Senhor nos ajude a compreender cada vez mais este mistério, para que O amemos sempre mais e por esse sacramento nos atraia cada vez mais para junto de Si; e para aprendermos a nos oferecermos com Ele também faz o gesto que nos deixa atônitos, lembrando que a nossa existência encontra sentido no serviço que prestamos ao próximo na multiforme expressão das vocações. 

Pe. João Bosco Vieira Leite  

Quarta, 17 de abril de 2019


(Is 50,4-9; Sl 68[69]; Mt 26,14-25) 
Semana Santa.

“Um dos doze discípulos, chamado Judas Iscariotes, foi ter com os sumos sacerdotes e disse:
‘O que me dareis se vos entregar Jesus?’ Combinaram, então, trinta moedas de prata” Mt 26,14-15.

“Usa-se de tudo para matar uma consciência, desde a perseguição, o martírio, o exílio, a prisão; mas vender já é demais! Como se pode vender um Deus? Jesus anda pelos povoados, está nas ruas de Jerusalém e passa noite no monte das Oliveiras. Difícil é prender alguém que vive no meio do povo pois não tem paradeiro fixo. Então é procurado; qualquer informação sobre seu paradeiro é uma ajuda enorme. Judas Iscariotes faz o preço para dar uma informação: 30 moedas de prata que equivalem ao preço de um escravo ou trinta diárias de uma jornada de trabalho braçal. Com dinheiro na mão fica mais fácil, até decretar a condenação de alguém que só passou fazendo o bem. O que o vendeu pertencia ao seu grupo de discípulos e foi corrompido pela estrutura opressora, ou por aqueles cinco minutos de fama que gostaria de ter. Com o dinheiro na mão fica difícil segurar a nitidez de um projeto de vida; de um modo ou de outro o dinheiro distrai. Seguir as exigências do Reino com seus valores éticos e religiosos é difícil e exige muita renúncia; seguir os apelos de trinta moeda de prata é mais agradável. Só uma coisa o dinheiro não compra: uma consciência tranquila, uma felicidade límpida, sem competições, sem tensões e subornos. Depois que vendeu é que o discípulo que caíra num vazio muito grande. Quis agradar os poderosos de seu tempo mas fez um péssimo negócio. – Senhor, que eu nunca traia o seu amor que está em mim vendendo-o por valores materiais deste mundo. Que a verdade que está em mim e que é fruto da sua graça não seja corrompida. Amém” (Vitório Mazzuco Filho – Graças a Deus (1995) – Vozes).

Pe. João Bosco Vieira Leite

Terça, 16 de abril de 2019


(Is 49,1-6; Sl 70[71]; Jo 13,21-33.36-38) 
Semana Santa.

“Fez de minha palavra uma espada afiada, protegeu-me à sombra de sua mão e fez de mim uma flecha aguçada, escondida em sua aljava” Is 49,2.

“O cap. 49 de Isaías é fantástico. Nele, o Senhor anuncia alguém especial. Pode referir-se ao próprio Profeta Isaías, mas, ao que tudo indica, as palavras deste capítulo referem-se a alguém que traria a salvação e reuniria o povo de Deus. Alguém que seria o enviado de Deus, servo do Senhor. Este versículo do cap. 49 de Isaías revela alguém que, com sua boca que era uma espada afiada, anunciou a vontade do Senhor. Estas palavras bíblicas também revelam alguém que foi revelado no momento certo, como uma arma poderosa guardada para o melhor momento de ser usada. Eis as profecias sobre Jesus. Eis o anúncio de Deus a respeito do Salvador. Aquele que, com sua boca, anunciou a Palavra do Senhor. Palavra que era como uma espada afiada, tanto para consolar como para quebrantar corações. Aquele que é como uma flecha aguçada, pronta para a batalha. Através da Palavra de Deus, Jesus continua sendo espada afiada e uma flecha aguçada. Sua Palavra é poderosa para animar aos que estão sem rumo no seu viver, para consolar aqueles que choram, para acalmar aqueles que enfrentam tantas situações difíceis. Sua Palavra é poderosa para cortar, quebrantar. Ele faz acordar de uma vida na escuridão, sem fé, sem perdão. Vale a pena lembrar que a mesma palavra que quebra, é a mesma que sara. – Senhor Deus, continue a enviar Jesus ao meu coração. Através dos meios da graça, quebre, remonte e modele meu jeito de viver, ser e pensar. Quero ser teu, somente teu. Mantenha-me firme nesta fé cristã. Por Jesus, teu Filho e meu Salvador. Amém!” (Bruno Arnoldo Kruger Serves – Meditações para o dia a dia [2017]- Vozes).

Pe. João Bosco Vieira Leite