(2Ts 3,6-10.16-18; Sl 127[128]; Mt 23,27-32)
21ª Semana do Tempo Comum.
“Ai de vós, mestres
da Lei e fariseus hipócritas! Vós construís sepulcros para os profetas e
enfeitais os túmulos dos justos, e dizeis: ‘Se tivéssemos vivido no tempo dos
nossos pais, não teríamos sido cúmplices da morte dos profetas’” Mt 23,29-30.
“A última invectiva
trata da relação com os antepassados. Os fariseus distanciavam-se dos atos de
seus pais. Nesse ponto, focaliza-se a maneira de lidar com o passado. Devemos
ser muito criteriosos quando escolhemos as figuras do passado à memória das
quais erguemos monumentos e que nos servem de modelo. Quando veneramos os
mártires pode acontecer que vejamos neles apenas uma justificativa para as
tendências assassinas que vicejam em nosso íntimo e que se manifestaram
abertamente nos algozes dos santos do início da era cristã ou nos carrascos
nazistas que dizimaram as fileiras da resistência. Quando veneramos teólogos
como santos devemos lançar também um olhar crítico sobre as consequências
provocadas por suas teologias, para verificar se foram benéficas ou
desastrosas, do contrário ficamos condenados a repetir a mesma história.
Gostaríamos de manter distância em relação aos atos negativos de nossos pais e
não percebermos que somos iguais a eles. Essa regra se aplica inclusive à
história de nosso próprio pai. Quem pretende ser totalmente diferente de seu
pai acaba muitas vezes encarnando justamente aqueles aspectos que recrimina
nele. O mesmo se aplica à história de um povo ou de uma Igreja. Jesus nos
estimula a manter um distanciamento crítico em relação ao passado e fazer um
exame de consciência para ver se não estamos agindo da mesma maneira que os
matadores dos profetas de nossa história. Dessa forma, todas as sete invectivas
podem ser interpretadas como advertências dirigidas a nós mesmos, para
examinarmos a nossa consciência. Onde estamos abusando da espiritualidade para
construir diante dos outros uma boa imagem de nós mesmos ou para criar uma
dependência em relação a nós, a fim de exercer poder por meio da espiritualidade?
Nenhum religioso está protegido contra esse abuso espiritual. Ele pode
insinuar-se tanto em grupo conservadores quanto progressistas, tanto no âmbito
eclesiástico quanto nos meios do new age. Em toda parte, existem
pessoas que, em seu caminho espiritual, não conseguem libertar-se de seu ego;
ao contrário, elas se valem da espiritualidade para inflar o seu ego e torna-lo
imune a qualquer atitude crítica. Os romanos já diziam: Corruptio
optimi pessima, isto é, a pior corrupção é a corrupção do melhor. O abuso da
espiritualidade causa os maiores estragos na humanidade” (Anselm Grün
– Jesus, Mestre da Salvação – Loyola).
Pe. João Bosco Vieira Leite