Terça, 14 de janeiro de 2020

(1Sm 1,9-20; Sl 1Sm 2; Mc 1,21-28) 
1ª Semana do Tempo Comum.

“Estava então na sinagoga um homem possuído por um espírito mau.” Mc 1,23.

“A primeira história de cura tem sentido programático para Marcos. É a cura de um possesso. Por meio dela, quer mostrar que a doença significa sempre uma possessão. Os demônios que dominam o ser humano representam coerção, ideias fixas, complexos neuróticos. Marcos fala também em espíritos turvos. Estes turvam a imagem que o homem tem de si, mas também a imagem que ele tem de Deus. São forças estranhas que dominam o ser humano. Marcos descreve o homem possuído como um homem que está dentro de ‘um espírito impuro’. Ele está no poder desse espírito impuro. Ao contrário dos discípulos que acreditam ‘dentro do evangelho’, trata-se de um homem que mora dentro de um espírito impuro, dentro da confusão, da obnubilação, do obscurecimento. Um espírito impuro como esse pode ser, por exemplo, a amargura que turva o pensamento. Mas pode tratar-se também de um ideal hipertrofiado de pureza que fecha os olhos diante de toda impureza, fazendo com que o ser humano fique justamente por isso repleto de imundície recalcada. Para Marcos, curar significa sempre que Jesus liberta o ser humano para este voltar a ser ele mesmo. Ele o arranca do poder dos espíritos turvos e impuros e o devolve a si próprio, ao seu verdadeiro ser. A primeira história de cura já revela a construção em forma de ‘sanduiche’ que Marcos usa para descrever cenas importantes para ele. O evangelista começa a cena com a informação de que Jesus estava ensinando na sinagoga de Cafarnaum. Os ouvintes se espantam com seus ensinamentos. Eles entram num estado de susto ou admiração, em êxtase, como diz original grego: ‘Pois ensinava como quem tem autoridade e não como os escribas’ (1,22). Depois conta a história da cura do possesso e, no fim, volta a descrever a reação das pessoas: ‘Eis um ensinamento novo, cheio de autoridade! Ele manda até nos espíritos impuros, e eles lhe obedecem’ (1,27). Com essa narração concêntrica, Marcos mostra que os ensinamentos de Jesus não são inócuos: ele cura justamente por meio de seus ensinamentos. Falando corretamente de Deus, Jesus liberta o homem para este ser ele mesmo. A imagem de Deus e a imagem de si próprio estão intimamente ligadas. Anunciando ao homem o Deus que cura e liberta, que confirma e encoraja, ele livra as pessoas de suas ideias doentias de Deus e as ergue, para que sejam plenamente elas mesmas” (Anselm Grun – Jesus, Caminho para a Liberdade – Loyola).

Pe. João Bosco Vieira Leite