(Ez 47,1-2.8-9.12; Sl 45[46]; Jo 2,13-22) Dedicação da Basílica do Latrão.
“No templo, encontrou vendedores de
bois, ovelhas e pombas e os cambistas que estavam aí sentados”
Jo 2,14.
“O
dado foi recordado pelos observadores do fato religioso: Deus está presente nos
povos pobres e marginalizados da terra, e está se ocultando lentamente nos
povos ricos e poderosos. Os países que são pobres em poder, dinheiro e
tecnologia são mais ricos em humanidade e espiritualidade do que as sociedades
que os marginalizam. Talvez, o antigo relato de Jesus expulsando do Templo os
vendedores nos leve à pista, não à única, que pode explicar o porquê deste
ocultamente de Deus, precisamente nas sociedades da abundância e do bem-estar.
O conteúdo essencial da cena evangélica pode resumir-se desta maneira: onde se
busca o próprio proveito não há lugar para um Deus que é Pai de todos. Quando
Jesus chega a Jerusalém, não encontra gente que busca a Deus, mas comércio. O
próprio Templo converteu-se num grande mercado. A religião continua
funcionando, mas ninguém escuta a Deus. Sua voz se extingue, silenciada pelo
ruído do dinheiro. O que interessa é apenas o próprio proveito. Segundo o
evangelista, Jesus atua movido pelo ‘zelo da casa de Deus’. O termo grego
significa ardor, paixão. Jesus é um ‘apaixonado’ pela causa do verdadeiro Deus
e, quando vê que está sendo desfigurado por interesses econômicos, reage com
paixão, denunciando essa religião falsa e hipócrita. A atuação de Jesus lembra
as terríveis condenações pronunciadas no passado pelos profetas de Israel. Só
vou citar as palavras que Isaías põe nos lábios de Deus: ‘Estou farto de
holocaustos... Não continueis a trazer-me oferendas vazias, nem incenso
execrável... Eu desteto vossas solenidades e festas; tornaram-se para mim um
peso que não suporto. Quando estendeis vossas mãos, fecho os olhos; ainda que
multipliqueis as orações, não escutarei. Vossas mãos estão cheias de sangue.
Lavai-vos, afastai de minha vista vossas más ações. Cessai de fazer o mal e
aprendei a fazer o bem. Buscai a justiça, corrigi o opressor. Fazei justiça ao
órfão, defendei a viúva. Então vinde’ (Is 1,11-18). Não é de estranhar que na
‘Europa dos comerciantes’ se fale hoje de ‘crise de Deus’ (Gotteskrise). Onde
se busca a própria vantagem ou ganho, sem levar em conta os necessitados, não
há lugar para o verdadeiro Deus. Ali o anseio pela transcendência se apaga e as
exigências do amor são esquecidas. Esta Europa do bem-estar, onde a crise de
Deus já está gerando uma profunda crise do ser humano, precisa ouvir uma
mensagem clara e apaixonante: ‘Quem não pratica a justiça e quem não ama seu
irmão, não é de Deus’ (1Jo 3,10)” (José
Antonio Pagola – O Caminho Aberto por Jesus – João – Vozes).
Pe.
João Bosco Vieira Leite