(Fl 2,12-18; Sl 26[27]; Lc 14,25-33) 31ª Semana do Tempo Comum.
“Quem não carrega sua cruz e não caminha
atrás de mim não pode ser meu discípulo” Lc 14,27.
“Para
Jesus, segui-lo é seguir o caminho da cruz. No evangelho de Lucas, Jesus
convida os seus discípulos duas vezes a carregarem a sua cruz: ‘Quem não
carrega sua cruz e não vem em meu seguimento não pode ser meu discípulo’ (Lc
14,27); ‘Se alguém quiser vir em meu seguimento, renuncie a si mesmo, e tome
sua cruz cada dia e siga-me’ (Lc 9, 23). A primeira palavra mostra a seriedade
do ‘seguir’. Quem segue Jesus deve contar com isto: o seu caminho há de levar
também à cruz, à perseguição, a hostilidade e finalmente à morte. A segunda
palavra interpreta o seguimento da cruz como caminho espiritual. Lucas
acrescenta aqui ‘cada dia’. Aí a cruz se torna imagem das aflições e dos
conflitos cotidianos. Todo dia alguma coisa nos contraria. Todo dia os outros
nos decepcionam ou nos ofendem. Se entendermos os desafios de cada dia como uma
cruz, não nos farão desanimar: a cruz há de nos levar a uma união mais profunda
com Cristo. A cruz acabará com a nossa vaidade. Vivemos muitas vezes, no nosso
dia-a-dia, com uma imagem idealizada, ilusória de nós mesmos. Pensamos estar
obedecendo à vontade de Deus, cumprindo o nosso dever. Quando alguém, então,
nos critica e nos trata com injustiça, quando nos despreza e humilha, então
sentimo-nos ofendidos e lamentamos a nossa situação. Jesus quer nos convidar
para que deixemos nos lavrar por essas aflições de cada dia, para Deus. É isso,
creio, que significa ‘abnegação’. Acontece que a palavra ‘abnegação’ muitas
vezes foi mal entendida, como se devêssemos renegar completamente, nos
desvalorizar ou deformar. A palavra grega ‘arneisthai’ significa ‘negar’,
‘resistir’, ‘distanciar-se’. Pelas experiências da cruz na minha vida devo
renegar o meu ego que se enfuna, e imagina que tudo deve servir só a ele, mas
para descobrir o meu verdadeiro ‘eu’. Devo me distanciar do egoísmo que
gostaria de puxar tudo para si mesmo, a fim de descobrir debaixo disso o
verdadeiro núcleo da minha pessoa. Essa palavra de Jesus não é uma exortação
para eu tornar a minha vida bem penosa para mim mesmo e para me sobrecarregar,
e sim um convite para me deixar lavrar pela vida e pelas suas aflições, para
Deus. Então a vida me levará até Deus. Então a cruz se tornará a chave da vida.
Abrirá a porta para o centro da minha alma, sou eu, além de sucesso e
bem-estar, além de reconhecimento e acolhimento, além de crítica e humilhações” (Anselm Grüm – Jesus,
modelo do ser humano – Loyola).
Pe.
João Bosco Vieira Leite