16º Domingo do Tempo Como – Ano B

(Jr 23,1-6; Sl 22[23]; Ef 2,13-18; Mc 6,30-34)*

1. No domingo anterior meditávamos sobre o aspecto missionário do nosso ser cristão, a partir do envio dos apóstolos. Nesse domingo a atenção se volta para o pastor. Tudo indica que na composição da Liturgia da Palavra desses domingos haja uma intenção de nos levar a refletir sobre como nasce e se desenvolve uma comunidade cristã.

2. Mesmo sendo um texto breve, de uma travessia, várias reflexões nos são possíveis. Os apóstolos estão de volta da missão. Em torno a Jesus, eles relatam tudo que tinham feito e ensinado. Felizes, mas também cansados, recebem de Jesus um convite para descasar um pouco. Temos aqui uma breve visão do dia a dia de Jesus.

3. O descanso parece durar o tempo de uma travessia, pois a multidão já os esperava na outra margem. Isso nos leva a pensar que foram remando devagar ou parando por alguma hora para pescar. Ao ver a multidão, que o espera, Jesus não se irrita pelo descanso interrompido, mas recomeça com calma a ensinar ao povo.

4. É esse olhar e atitude de Jesus que será nosso ponto de reflexão. Nosso olhar se volta aos pastores, mas de modo que seja ouvido e seja útil também às ovelhas. Esse discurso aos pastores começa na 1ª leitura com Jeremias, e começa num tom ameaçador.

5. Mas as palavras finais nos conduzem ao Evangelho à figura do pastor prometido que se concretiza em Jesus, em sua ação exemplar. Aqui percebemos o seu cuidado para com as multidões e para com os futuros pastores. Como um bispo com seu clero, sem esquecer do resto do rebanho.

6. No Evangelho de Marcos estamos iniciando seção que se desenvolve da saída da Galileia até a ida a Jerusalém, onde Jesus empreende a formação dos seus discípulos, para darem continuidade a sua missão, após a sua morte; a serem animadores e pastores das comunidades.  

7. Nesse caminho Jesus alterna ‘ação’ e ‘contemplação’; o contato com as multidões e a solidão com Ele. Ensina-os a rezar e os instrui sobre os mistérios do Reino. Jesus não os trata como subalternos, mas como amigos. Desse modo, pouco a pouco, retira-lhes o ânimo inato de mercenário e cria neles a alma do pastor.

8. Desta cena de Jesus com os apóstolos, de repente se apresenta a segunda parte do Evangelho: ‘Jesus e as multidões’. Jesus não apresenta nenhuma rigidez. Ele se comove, tem compaixão. A frase de Jesus traduz um sentido de ternura infinita.

9. Essa cena culminará na multiplicação dos pães que veremos no próximo domingo na narrativa de João. Mas eles não vieram por causa disso. Vieram porque não têm ninguém a recorrer e, de surpresa, encontraram, enfim, alguém que não os despreza, mas lhes dá esperança.

10. Podemos imaginar a multidão que Jesus tinha à sua frente. Religiosamente viviam à margem da Lei que não conhecem ou não podem observar; politicamente só se pensa neles para lhes cobrar impostos e contribuições. Jesus se compadece diante de uma humanidade ‘humilhada e ofendida’ e, mais ainda, diante de sua necessidade e sua espera do Reino de Deus.

11. Jesus não faz nenhum discurso inflamado de revolta social, mas ensina-lhes muitas coisas, certamente coisas que diziam respeito ao Reino de Deus. Ele as eleva, as faz tornarem-se humanas, exatamente através da fé. Não protela o discurso do Reino para quando estivessem de barriga cheia.

12. Há muito a se refletir sobre isso; talvez alguns de nossos discursos sobre a evangelização e a promoção humana devam ser redirecionados para que sejam mais conformes a lógica do Evangelho.

13. O Evangelho nos fala de uma certa movimentação, busca, seja por parte da multidão, seja do pastor. Há ‘busca’ de ambas as partes. Procurar e oferecer-se: ninguém, com efeito, nem mesmo o Papa, é na Igreja somente pastor, mas também ovelha, e ninguém é somente ovelha, mas também pastor, isto é, responsável de algum modo pelos irmãos do Reino.

14. Muitas comunidades cristãs refloresceriam se houvesse um contato maior e o intercâmbio mais vivo entre o clero e os leigos, e se cada um pudesse experimentar a alegria de pôr a serviço o próprio carisma, seja grande ou pequeno. Enfim, não percamos de vista essa confiança sem medida em Jesus pastor. É ele que nos prepara a mesa do seu corpo e sangue. Como o salmista, expressemos nossa gratidão.

* Reflexão com base em texto de Raniero Cantalamessa.   

Pe. João Bosco Vieira Leite