29º Domingo do Tempo Comum – Ano C

(Ex 17,8-13; Sl 120[121]; 2Tm 3,14—4,2; Lc 18,1-8)

1. Mais uma parábola desconcertante. O modelo de oração nos vem de uma pobre viúva (até aí tudo bem). Mas quando a intervenção de Deus é comparada àquela de um ministro desonesto... aqui a coisa se complica. Mas antes de nos escandalizarmos, é preciso olhar os protagonistas dessa parábola.

2. Temos esse juiz, alguém a ser evitado. Sem religião, sem humanidade, alérgico a cumprir o próprio dever. Se não recebe ordens de Deus, também não escuta a própria consciência. Um indivíduo egoísta, impermeável a qualquer sentimento. Insensível a tudo e a todos.

3. Do outro lado temos uma viúva. A imagem da fragilidade. Sem apoios, sem recomendações. Certamente não pode pagar um advogado. Ela tem que enfrentar um adversário e um magistrado. Vítima de dois abusos: prepotência de um lado e inércia da outra. A batalha parece já começar perdida.

4. Mas ela não se rende. Vai ao juiz, uma, dez, vinte vezes. O aborda sempre que o vê. Não se cansa diante da rejeição. O persegue, o pressiona, lhe ocupa os ouvidos. Ele pôr fim se cansa e decide fazer justiça para se livrar da mesma.

5. Na realidade a viúva percebeu que ele tinha um ponto frágil: o seu próprio egoísmo; o seu desejo de não ser importunado. Com sua persistência, abre uma brecha precisamente naquele ponto. O ataca não no terreno da piedade, mas da insensibilidade. Ele se cansa de toda aquela irritação.

6. A justiça é feita, não porque se escutou a voz imperiosa do direito, mas porque não se quer mais escutar uma voz incômoda. Assim a fragilidade prevalece sobre a força. A pessoa indefesa teve razão sobre o poder arrogante. Essa é a primeira lição da parábola.

7. Não devemos ter medo da nossa fragilidade, nem desencorajar-nos em nossa impotência. Não deixemo-nos impressionar pela dificuldade. É inútil buscar apoio fora. A arma decisiva está dentro de nós. E é justamente a nossa fragilidade, a nossa pobreza. É somente com ela que temos a certeza de vencer.

8. Não devemos cansar se a resposta demora. Não percamos o ânimo de a nossa voz arrisca-se a gritar inutilmente. A demora, ao contrário de esfriar a esperança, é uma razão para alimentá-la.

9. Pois, do outro lado – e aqui o segundo protagonista não é uma cópia, mas sim a imagem contrária de Deus! – não está um juiz insensível, mas um Pai que se deixa ferir pelos gritos dos seus filhos e é impaciente no desejo de atendê-los.

10. Assim, não se trata da fraqueza contra a força. Mas de uma fraqueza, a nossa, contra uma outra fraqueza, aquela de Deus. Nada é mais vulnerável do que um Deus que ama. Deus nos atende não para não ser mais aborrecido. Ele ama a nossa insistência. Deseja ser importunado, porque tudo lhe chega através do canal da fé. 

11. A parábola termina com uma pergunta inquietante. É certo que o tempo de Deus não é o nosso. Mesmo que Deus tenha pressa de nos atender, pode acontecer que a nossa fé já se tenha apagado. Nosso cansaço pode chegar primeiro.

12. Se interrompemos o canal da fé, muitas respostas não chegam ao seu destino. E temos a coragem de lamentar-nos porque Deus é surdo, que não nos escuta... Que pensar se, no dia em que o juiz decidir responder a viúva, essa simplesmente não se faça ver?

 Pe. João Bosco Vieira Leite