1. Este ano nos trouxe a proximidade da
celebração litúrgica dos fiéis defuntos e de Todos os Santos aqui no Brasil,
que as deixa distantes por transferir a solenidade para o domingo. Duas
celebrações voltadas para as realidades últimas que meditaremos em separado,
mas ambas iluminadas pela Ressurreição de Cristo.
2. Hoje o nosso olhar se volta para os
numerosos rostos que nos precederam e que concluíram seu caminho terreno.
Nesses dias, muitos foram aos cemitérios para rezar por seus entes queridos,
como uma espécie de visita que busca manifestar carinho e senti-las mais
próximas.
3. A comunhão dos santos, que
professamos em nosso credo, nos lembra esse vínculo estreito entre nós que
caminhamos na Terra e aqueles que já alcançaram a eternidade.
4. São muitos os ritos que procuram
preservar a memória; são muitos também os sinais que ainda encontramos nos
túmulos de como viveram, o que amaram, o que temeram e o que detestaram.
* Falamos da violência que nos cerca,
mas de certo modo, evitamos o pensamento da morte que diz respeito a cada um de
nós.
5. É diante de tudo isso, e apesar de
tudo isso, buscamos algum sinal que nos convide a esperar, algo que nos traga
consolação, que abra algum horizonte, que ofereça ainda um futuro. É isso que
esses retalhos da Palavra que ouvimos nos oferece.
6. Mas, por que sentimos medo diante da
morte? Por que muitos ainda não se deixaram levar pelo pensamento tão apregoado
em nossos tempos que para além da morte não existe simplesmente nada?
7. Temos medo por que desconhecemos o
que virá e por isso rejeitamos a simples aceitação que tudo quanto de belo e grande
que foi realizado durante uma existência inteira seja repentinamente eliminado
e precipite no abismo do nada.
8. O medo também nos vem dessa
consciência que nos traz a Palavra de que existe um juízo sobre as nossas
obras, sobre o modo como conduzimos a nossa vida, principalmente sobre aqueles
pontos de sombras que, com habilidade, muitas vezes sabemos anular ou tentamos
remover da nossa consciência.
9. É por essa questão do juízo, que no
cuidado que temos para com os que já partiram, os cerquemos de carinho e amor,
como se os quiséssemos proteger, para que não permaneçam nesse juízo. Isso não
está só entre nós católicos, mas na maior parte das culturas.
10. São muitas as possíveis respostas.
Nosso tempo tenta responder de modo racional, não tanto com a fé, mas a partir
de conhecimentos experimentais, empíricos. Por vezes caímos em formas de
espiritismo, na tentativa de manter algum contato com o mundo além da morte,
imaginando-o quase como uma réplica da vida presente.
11. A Solenidade de Todos os Santos e a
Comemoração de todos os fiéis defuntos dizem-nos que somente quem pode
reconhecer uma grande esperança na morte, pode também levar uma vida a partir da
esperança. O ser humano reduzido à sua dimensão horizontal perde o sentido
profundo da vida, pois carrega consigo uma sede de eternidade. Esse sentido
mais profundo só é possível se Deus existir.
12. É o mistério desse Deus que se fez
próximo e entrou na nossa vida que hoje celebramos. Ele que nos diz: “Eu sou a
Ressurreição e a Vida; quem crê em Mim, ainda que esteja morto viverá”. Esse
mesmo Deus que mergulhou no abismo da morte, venceu-a, ressuscitou e abriu
também para nós as portas da eternidade.
13. É precisamente a fé na vida eterna
que confere aos cristãos a coragem de amar ainda mais intensamente esta nossa
Terra e de trabalhar para lhe construir um futuro, para lhe dar uma esperança
verdadeira e segura.
* Compartilho nessa
homilia alguns pontos da reflexão do Papa Emérito Bento XVI.
Pe. João
Bosco Vieira Leite