Todos os fiéis defuntos - 02/11/2019

(Sb 3,1-9; Sl 41[42]; Ap 21,1-5a.6b-7; Mt 5,1-12a)*

1. Este ano nos trouxe a proximidade da celebração litúrgica dos fiéis defuntos e de Todos os Santos aqui no Brasil, que as deixa distantes por transferir a solenidade para o domingo. Duas celebrações voltadas para as realidades últimas que meditaremos em separado, mas ambas iluminadas pela Ressurreição de Cristo.

2. Hoje o nosso olhar se volta para os numerosos rostos que nos precederam e que concluíram seu caminho terreno. Nesses dias, muitos foram aos cemitérios para rezar por seus entes queridos, como uma espécie de visita que busca manifestar carinho e senti-las mais próximas. 

3. A comunhão dos santos, que professamos em nosso credo, nos lembra esse vínculo estreito entre nós que caminhamos na Terra e aqueles que já alcançaram a eternidade.

4. São muitos os ritos que procuram preservar a memória; são muitos também os sinais que ainda encontramos nos túmulos de como viveram, o que amaram, o que temeram e o que detestaram.
* Falamos da violência que nos cerca, mas de certo modo, evitamos o pensamento da morte que diz respeito a cada um de nós.

5. É diante de tudo isso, e apesar de tudo isso, buscamos algum sinal que nos convide a esperar, algo que nos traga consolação, que abra algum horizonte, que ofereça ainda um futuro. É isso que esses retalhos da Palavra que ouvimos nos oferece.

6. Mas, por que sentimos medo diante da morte? Por que muitos ainda não se deixaram levar pelo pensamento tão apregoado em nossos tempos que para além da morte não existe simplesmente nada?

7. Temos medo por que desconhecemos o que virá e por isso rejeitamos a simples aceitação que tudo quanto de belo e grande que foi realizado durante uma existência inteira seja repentinamente eliminado e precipite no abismo do nada.

8. O medo também nos vem dessa consciência que nos traz a Palavra de que existe um juízo sobre as nossas obras, sobre o modo como conduzimos a nossa vida, principalmente sobre aqueles pontos de sombras que, com habilidade, muitas vezes sabemos anular ou tentamos remover da nossa consciência.

9. É por essa questão do juízo, que no cuidado que temos para com os que já partiram, os cerquemos de carinho e amor, como se os quiséssemos proteger, para que não permaneçam nesse juízo. Isso não está só entre nós católicos, mas na maior parte das culturas.

10. São muitas as possíveis respostas. Nosso tempo tenta responder de modo racional, não tanto com a fé, mas a partir de conhecimentos experimentais, empíricos. Por vezes caímos em formas de espiritismo, na tentativa de manter algum contato com o mundo além da morte, imaginando-o quase como uma réplica da vida presente. 

11. A Solenidade de Todos os Santos e a Comemoração de todos os fiéis defuntos dizem-nos que somente quem pode reconhecer uma grande esperança na morte, pode também levar uma vida a partir da esperança. O ser humano reduzido à sua dimensão horizontal perde o sentido profundo da vida, pois carrega consigo uma sede de eternidade. Esse sentido mais profundo só é possível se Deus existir.

12. É o mistério desse Deus que se fez próximo e entrou na nossa vida que hoje celebramos. Ele que nos diz: “Eu sou a Ressurreição e a Vida; quem crê em Mim, ainda que esteja morto viverá”. Esse mesmo Deus que mergulhou no abismo da morte, venceu-a, ressuscitou e abriu também para nós as portas da eternidade.

13. É precisamente a fé na vida eterna que confere aos cristãos a coragem de amar ainda mais intensamente esta nossa Terra e de trabalhar para lhe construir um futuro, para lhe dar uma esperança verdadeira e segura. 
* Compartilho nessa homilia alguns pontos da reflexão do Papa Emérito Bento XVI.

 Pe. João Bosco Vieira Leite