(Ap 7,2-4.9-14; Sl 23[24]; 1Jo 3,1-3; Mt 5,1-12a)
1. Um homem doa sua vida no lugar de um
pai de família num campo de concentração. Uma mulher resolve deixar as regras
da congregação para auxiliar os doentes e pobres que perambulam pelas ruas de
Salvador.
2. Um se dedica a causa dos jovens,
outra resolve levar a gravidez de risco adiante, alguém é assassinado por
defender o direito dos favelados ou mesmo por lutar por um ambiente que seja
inteiro, mais que um meio ambiente.
3. São figuras assim, comprometidas com
as causas da vida ou mesmo por uma expressão de profunda comunhão com Deus que
se tornaram sentinelas, luminárias de que a vida é bem mais que simplesmente
viver e morrer.
4. A intenção da nossa liturgia não é
tanto trazer presente o grande número de santos canonizados pela Igreja, mas
todos aqueles e aquelas, que salvos pela misericórdia de Deus, formam assim a
chamada ‘Igreja triunfante’, como nos lembra a 1ª Leitura: ‘uma multidão imensa
de gente de todas as nações, tribos, povos e línguas, que ninguém podia
contar’.
5. Mais do que simplesmente querer unir
numa única celebração os santos assim reconhecidos ou mesmo recorrer à sua
intercessão, o objetivo, nos lembra o Papa Francisco em sua exortação
apostólica desse ano, e que será tema do nosso tríduo, é fazer ressoar mais uma
vez a chamada à santidade, procurando encarná-la no contexto atual, com seus
riscos, desafios e oportunidades.
6. A primeira coisa que se deve fazer é
libertar a palavra ‘santidade’, desse medo que ela incute diante de certas
representações erradas. A santidade pode comportar fenômenos extraordinários,
mas não se identifica com esses.
7. A santidade é um chamado universal,
porque entendida de maneira correta, como nos lembra a 2ª leitura, ela está na
nossa condição filial: ‘sede santos porque vosso Pai celestial é santo’, dirá
Jesus, porque Ele entende, que apesar de toda a ideia de santidade divina do
Antigo Testamento, essa consiste numa busca de fazer a vontade de Deus e de uma
comunhão sempre maior.
8. Para Paulo, nós cristãos somos
santos por vocação, porque Deus nos escolheu. Paulo entende a santidade não
como algo ritual ou legal, mas moral; não está nas mãos, mas no coração; não se
decide fora, mas dentro do ser humano e se resume na caridade, como vimos no
evangelho da missa de Finados (Jornal ‘O Domingo’).
9. Assim, o mediador da santidade de
Deus não é um lugar, um rito, objeto ou leis, mas uma pessoa: Jesus Cristo.
Sobre a essência da santidade, podem
haver muitas teorias, abundantes explicações e distinções. Mas nada é mais
esclarecedor que as palavras do próprio Jesus. O primeiro texto que nos oferece
o Papa é o das bem-aventuranças (Mt 5,3-12; Lc 6,20-23). Elas são como que o
bilhete da identidade cristã.
10. A palavra ‘feliz’ ou
‘bem-aventurado’ torna-se sinônimo de ‘santo’, porque expressa que a pessoa
fiel a Deus e que vive a sua Palavra alcança, na doação de si mesma, a
verdadeira felicidade. A proposta de Jesus, mesmo fascinante, vai na contramão,
pois o mundo nos conduz para um outro estilo de vida.
11. O segundo texto é Mt 25,31-46:
o agir misericordioso aparece como uma receita ao caminho de santidade que se
deseja. Neste apelo a reconhecê-lo nos pobres e atribulados, revela-se o
próprio coração de Cristo, os seus sentimentos e as suas opções mais profundas,
com os quais se procura configurar todo o santo.
12. Não podemos propor-nos um ideal de
santidade que ignore a injustiça deste mundo, onde alguns festejam, gastam
folgadamente e reduzem a sua vida às novidades do consumo, ao mesmo tempo que
outros se limitam a olhar de fora enquanto a sua vida passa e termina
miseravelmente.
13. Na meditação desses dois polos que
abrem e encerram o evangelho de Mt podemos refletir sobre a vontade de Deus no
que devemos ser e no que devemos fazer para viver santamente na presença de
Deus. Mais que coisas grandiosas, os textos refletem o cotidiano com suas
virtudes e lutas.
Pe. João Bosco Vieira Leite