Quarta, 21 de novembro de 2018


(Zc 2,14-17; Sl Lc 1; Mt 12,46-50) 
Apresentação de Nossa Senhora.

“A minha alma engrandece ao Senhor, e se alegrou o meu espírito em Deus, meu Salvador” Lc 1, 46b-47.

“E a Nossa Senhora, você reza a Nossa Senhora? Mas será que você reza o necessário, será que você implora a proteção de Nossa Senhora? Ela é nossa mãe, não se pode duvidar. É a mãe do gênero humano, a nova Eva. Mas é também sua filha. O antigo mundo, o doloroso mundo, o mundo de antes da graça embalou-a, longamente, em seu desolado coração – durante séculos e séculos – na obscura expectativa, na incompreensível esperança de uma Virgo Genetrix... Durante séculos e séculos, o mundo protegeu com suas velhas mãos carregadas de crimes, suas pesadas mãos, a jovenzinha maravilhosa, da qual nem ao menos o nome sabia. Uma jovem, esta rainha dos Anjos! E ainda o é, a rainha dos Anjos, não se esqueça! Mas, agora menino, veja bem uma coisa: a Santa Virgem não teve nem triunfo, nem milagres. Seu filho não permitiu que a glória humana a roçasse, mesmo com a mais fina extremidade de sua enorme asa selvagem. Ninguém viveu, sofreu ou morreu, assim tão simplesmente e numa ignorância tão profunda de sua própria dignidade, de uma dignidade que a coloca, entretanto, acima dos Anjos. Pois, afinal de contas, nasceu sem pecado: espantosa solidão! Uma fonte tão pura, tão límpida, e tão pura que não podia sequer refletir sua própria imagem, imagem feita apenas para a alegria do Pai: ó sagrada solidão! Os antigos demônios familiares aos homens, amos e servidores ao mesmo tempo, os terríveis patriarcas que giraram os primeiros passos de Adão até o limiar do mundo maldito, a Astúcia e o Orgulho, olham de longe essa milagrosa criatura, colocada fora do seu alcance, invulnerável e desarmada. Certamente, nossa pobre espécie não vale grande coisa, mas a infância comove sempre suas entranhas, a ignorância dos pequenos a obriga a baixar os olhos – olhos que conhecem o bem e o mal, olhos que viram tantas coisas! Mas, apesar de tudo, no caso, apenas ignorância... A Virgem , a Virgem era a Inocência. Imagine agora o que somos para ela, nós, a raça humana! Oh! Naturalmente, Nossa Senhora detesta o pecado; mas, ao final das contas, não em nenhuma experiência dele, essa experiência que não faltou aos nossos maiores santos, ao próprio santo de Assis, por mais seráfico que tenha sido. O olhar da Virgem é o único olhar verdadeiramente infantil, o único verdadeiro olhar de criança que jamais se fixou em nossa vergonha, em nossa desgraça. Sim, meu filho, para implorá-la bem, é preciso sentir sobre si este olhar que não é exatamente o da indulgência – pois a indulgência vem sempre acompanhada de certa experiência amarga – mas o olhar da terna compaixão, da dolorosa surpresa, de não sei que outro sentimento inconcebível, inexprimível, que a faz mais jovem que o pecado, mais jovem que a raça da qual ela mesmo procede; e ainda que seja Mãe pela graça, mãe das graças, é também a caçula do gênero humano” (Georges Bernanos – Diário de um pároco de aldeia – Ed. Atlântica).  

 Pe. João Bosco Vieira Leite