29º Domingo do Tempo Comum – Ano B

(Is 53,10-11; Sl 32[33]; Hb 4,14-16; Mc 10,35-45)

1. A cada domingo buscamos recolher da Palavra de Deus algo concreto para a vida cotidiana e seus problemas, sobre o que fazer e como se comportar neste ou noutro caso da vida. É o que chamamos de leitura moral da Escritura, é quando a Palavra ‘revela a verdade do seu humano’.

2. Mas esse não é o aspecto mais importante da Palavra de Deus. O mais importante é ‘a verdade sobre Deus e sobre Jesus Cristo’ que ela quer nos transmitir. Foi justamente essa verdade sobre Cristo que determinou a busca de Paulo, para ter em si ‘os mesmos sentimentos de Cristo’ (cf. Fl 2,5). E assim suas escolhas estariam em harmonia com o Evangelho, na certeza de que Cristo age por nós e conosco.

3. É nesse segundo olhar que se apresenta a liturgia da Palavra nesse domingo. O que exige sempre uma atenção e esforço maior da nossa parte; veremos que sempre vale a pena e que isso se reflete de modo imediato também em nossa vida de todos os dias.

4. Em nosso evangelho temos duas partes. Num 1º momento temos esse episódio sobre a busca dos primeiros lugares que persiste entre os apóstolos. Mas o sentido desse episódio está na 2ª parte onde Jesus anuncia pela 3ª vez sua paixão e algo sobre: ‘O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida como resgate para muitos’.  

5. Essa consciência que Jesus tinha de si e da sua vida tem um 1º reflexo na 1ª leitura nesse misterioso personagem que acolhe o apelo divino, dedicando sua vida, suportando sofrimentos até o sacrifício. Nele o sofrimento adquire sentido, para que não entre em desespero como Jó. Um sofrimento que ele sabe transforma-se em luz, libertação, resgate e salvação ‘para muitos’.

6. Para os judeus do tempo de Jesus, e também seus discípulos, que viviam particular sofrimento sob vários aspectos, algo ou alguém, viria em seu socorro. Mas não passava em seu pensamento a ideia de que esse alguém fosse o Messias, que esperavam de forma gloriosa e cheio de beleza. Não aquilo ou aquele pregado numa cruz.

7. Notamos que Jesus acaba adotando para si o título que davam ao Messias: ‘Filho do Homem’, com o objetivo de esvaziá-lo e preenche-lo com novo sentido. Não mais um general divino que abre caminho vencendo o inimigo político e instaurando um Reino de Deus político, não um dominador, mas um servo, não um vencedor, mas um vencido.

8. É nessa estrutura de profecia e realização, 1ª leitura e Evangelho, que se revela a verdadeira identidade de Jesus de Nazaré e onde temos o anúncio fundamental cristão: Jesus de Nazaré é o Messias sofredor que, em seu mistério pascal de obediência, nos redimiu.

9. Esse é o anúncio do Evangelho de hoje. Como reagimos diante de tudo isso? Podemos reagir com ‘indiferença’: ouve-se sem compromisso; esquece-se logo e se volta a rotina e à trivialidade de todos os dias.

10. Podemos também ‘rebelar-nos’, escandalizar-nos com tudo isso. O mundo já tem tanto sofrimento. Talvez o Deus de Jesus seja impotente diante do mal. Esse tipo de escândalo só se vence com a atitude da ‘fé’. A mesma fé que levou Paulo a fazer toda uma releitura de seu conhecimento judaico a ver nesse ‘escândalo da cruz’ a força de Deus e a sabedoria de Deus.

11. Um dia, quando esse mundo acabar, compreenderemos que não havia outro meio mais poderoso e mais sábio do que este para vencer o mal no mundo: isto é, que Deus mesmo o carregasse sobre si. E este servo sofredor é Aquele que ressuscitou, no lembra a 2ª leitura: “temos um sumo sacerdote eminente que entrou nos céus, Jesus, o Filho de Deus...” (cf. Hb 4,14-16).

Pe. João Bosco Vieira Leite