24º Domingo do Tempo Comum – Ano B

 (Is 50,5-9; Sl 114[115]; Tg 2,14-18; Mc 8,27-35)

1. Mais uma vez temos a célebre pergunta de Jesus a seus discípulos. Mas o acento litúrgico não está na pergunta ou resposta, seja de Jesus ou dos discípulos, e sim no anúncio da paixão, como nos introduz a 1ª leitura.

2. Temos também a repreensão a Pedro para culminar nesse ensinamento de Jesus à multidão sobre o seguimento e a cruz como sinal de tudo o que envolve o nosso discipulado. Já refletimos um pouco sobre tudo isso. O que nos permite voltar-nos sobre a 2ª leitura que nos fala de fé e obras.

3. Sempre se traz à tona o posicionamento de Paulo que nos diz que o homem não é justificado pelas obras da Lei, mas somente pela fé (Gl 2,16), como que contrapondo a Tiago. Não se pode afirmar tal oposição pois o mesmo Paulo tem consciência que tanto a fé, como as obras, são dons do próprio Deus para nossa salvação (cf. Ef 2,8-10).

4. Nós somos obra de Deus, isto é o essencial. Deus, porém, não nos salvou em Cristo para que permaneçamos inertes e passivos ou mesmo no pecado, mas para que fôssemos capazes de realizar, pela graça e pela fé, as boas obras que Deus predispôs para nós, que são as virtudes cristãs.

5. Em 1º lugar está a caridade para com o próximo. É o mesmo Paulo que, na 2ª metade da carta aos Romanos, elenca uma série de boas obras que deve praticar quem crê: caridade, serviço, obediência, pureza, humildade. (cf. Rm 12—14).

6. Essa síntese entre fé e obra custou muita discussão entre católicos e protestantes. Se sabe que não nos salvamos pelas boas obras, mas não nos salvamos também sem as boas obras; que somos justificados pela fé, mas é a fé mesma que nos impele às obras, para não assemelhar-nos àquele filho da parábola que diz logo ‘sim’ ao pai que lhe pede para trabalhar no campo, mas que depois não vai (cf. Mt 21,28s).

7.  Pensando de maneira prática, o filósofo Luterano S. Kierkegaard aconselhava a começar pelas obras, pois segundo ele é mais simples que o princípio da fé. Para chegarmos a uma autêntica fé supõe uma interioridade e uma pureza de espírito que poucos alcançam.

8. É mais fácil começar fazendo alguma coisa, ainda que de modo imperfeito. É mais fácil crer se, renegando-se a si mesmo, se começa a fazer alguma coisa.

9. É como alguém que vê aquelas imagens de sofrimentos geradas pelas chuvas do Rio Grande do Sul, sente uma profunda compaixão, que se sente ‘obrigado’ a mudar de canal, porém não faz nada, a não ser, quem sabe, rezar por eles. Não seriamos alvo da crítica de São Tiago?

10. Temos que ter a Paulo e Tiago juntos: Devemos fazer as boas obras, mas devemos fazê-la na fé. Como resposta àquilo que Deus fez por nós, em espírito de gratuidade, não por outros motivos, ainda que seja para ganhar o paraíso.

11. Fazer as boas obras na fé significa não sentir-se orgulhoso ou superior por ter feito algo de bom, mas tudo atribuir à graça de Deus. Sem deixar-nos guiar por critérios humanos de simpatia ou antipatia, mas tão somente da necessidade. O próprio Tiago nos aconselha a pedir a Deus a capacidade de fazer o bem (cf. Tg 1,5-7). Nada é tão simples assim como parece...   

Pe. João Bosco Vieira Leite