2º Domingo de Páscoa – Ano C

(At 5,12-16; Sl 117[118]; Ap 1,9-13.17-19; Jo 20,19-31)

1. Esse domingo de Páscoa é caracterizado pelo dom da paz, dom do Ressuscitado. Aqui se usa o termo Shalom, saudação habitual entre os israelitas, uma expressão que deseja algo bom. Mas essa paz era dom de Deus e, mais que um vocábulo, era um conceito religioso.

2. O estado de paz em uma pessoa indicava uma condição de plenitude, de bem-estar, com uma acentuação material, realizável somente através de uma íntima comunhão com Deus. O ressuscitado nos deseja a paz. E, entendamos bem, a sua paz.

3. Reflitamos sobre esta paz que devemos possuir em nós mesmos, para poder irradiá-la sobre os outros e tornar-nos, com nos diz as bem-aventuranças: ‘promotores da paz’.

4. Como para a alegria, também para a paz se pode dizer que existem em circulação dois tipos: Aquela que é nossa e aquela que nos dão os outros. A primeira tem uma característica inalterável. A outra é precária, provisória. Um exemplo para entendermos:

5. Um garoto um dia resolve construir em seu quintal, uma tenda ou cabana. Chama seus amigos e todos resolvem colaborar com a empreitada. Um traz hastes para sustentação, outro uma lona, uma cadeira, um tapete, um vaso, um espelho. Eles levam algumas semanas nessa construção.

6. Uma tarde, estando todos aproveitando o novo espaço, diz o garoto que o idealizou: ‘Se não fosse o meu quintal, não poderíamos ter essa tenda...’. Os outros colegas protestam, pois todo o resto foi patrocinado por eles. Cria-se uma discussão que termina por cada levando de volta o que trouxe e assim o garoto permanece só em seu quintal vazio.

7. O problema está todo aqui. Com quais materiais construímos a nossa paz? Quando alguém diz que ‘perdeu a sua paz’, porque alguém a levou é porque certamente não era dela. Os outros só levam aquilo que haviam emprestado.... Que era seu direito.

8. Muitas vezes a nossa paz é construída com material que não nos pertence. Alguém nos dá um pedaço de estima, um outro oferece um pouco de simpatia, alguém um naco de apreciação pelo nosso trabalho, uma declaração de acordo com as nossas ideias, um comprimento, um elogio.

9. E nós estamos em paz em nossa ‘cabana’. Tudo parece perfeito. Não temos a coragem de reconhecer que essa construção se fez de material recolhido, que nossa paz depende, na realidade, do que trouxeram os outros.

10. Um dia pode acontecer algum incidente. Alguém retira o seu pedaço (uma grosseria, uma incompreensão, uma observação injusta, uma indelicadeza, uma maledicência). E a nossa paz se vai. Não era nossa. Perdemos aquilo que não nos pertencia.

11. Para que a paz seja nossa, é preciso recebe-la como um dom de Cristo. Ele nos dá a sua paz. E para que se torne nossa, é preciso que a acolhamos como Cristo a concebeu. Uma paz crítica, capaz de romper com certos esquemas. A paz evangélica nos chama mais para a mudança do que para o repouso. Não é um ponto de partida, mas de chegada.

12. É uma paz diferente. Exclui o medo, pois deve ir sempre além e até contracorrente. Acolher a paz de Cristo significa acolher a Sua pessoa, em Sua paz, por vezes rejeitada. Por isso, somente nós podemos perde-la, se O perdemos de vista. A paz é mais que uma conquista, é uma escolha de caminhar sob a luz de Cristo. 

Pe. João Bosco Vieira Leite