8º Domingo do Tempo Comum – Ano C

(Eclo 27,5-8; Sl 91[92]; 1Cor 15,54-58; Lc 6,39-45)

1. Em alguns de nós, o instinto de julgar tem raízes profundas. Ousaria dizer que todos nascemos equipados para tal ação. Mas muitos amadureceram a consciência de que, se deixar levar por tal tendência é uma estupidez e que há outras mais importantes a se fazer na vida. 

2. Como se isso não bastasse, temos algumas intervenções do Evangelho a esse respeito, inibindo o gosto por essa ação perigosa. “Não julgueis e não sereis julgados; pois com a mesma com medires os outros sereis medidos” (cf. Mt 7,1-2).

3. Apesar dessas advertências, alguns cultivam esta vocação e encontram abundantes motivos para exercitá-la, de modo contínuo, como um tribunal ambulante, muitas vezes de modo implacável, contumaz e presunçoso.

4. Alguns agem ao estilo ‘rolo compressor’. Nenhum obstáculo o para - uma dúvida, uma hesitação, um mínimo de compreensão ou respeito – Tudo vem tratado de maneira uniforme. Só sabe julgar, acusar, denunciar, suspeitar, desqualificar, sentenciar, censurar, condenar.... e por aí vai.

5. Comumente isso é feito à revelia. Aquele que é condenado deve estar ausente. Melhor assim. Comumente os ‘tribunais ambulantes’ não suportam um ‘face a face’. Sua caridade fraterna consiste em demolir o outro, num processo indolor, pelo simples fato da ausência do imputado.  

6. Para um tipo de tribunal desse funcionar, é necessária uma boa dose de presunção. Presunção de quem se apropria de uma função que Deus reserva a si. Presunção de quem pretende afrontar o mistério profundo de uma pessoa servindo-se de instrumentos inadequados.

7. A ridícula presunção de quem mostra o cisco no olho do irmão e não percebe a trave sem medida que vive em seus olhos. Que pode julgar tudo e todos, mesmo sem competência. Mas ai de quem, a sua volta, ousa levantar uma mínima acusação contra ele. São pessoas profundamente sensíveis...

8. Mesmo se tratando de uma doença grave, ela não é incurável. Muitas terapias são capazes de ajudar nesse processo. Mas algumas receitas são antigas e acessíveis a todos.

9. Quando sentares no teu tribunal, recorda, simplesmente que você pode estar errado. Pode não estar de acordo com o que diz o Evangelho, primeiramente. Para um cristão, as relações com o próximo se baseiam em ‘ser com’ ou ‘ser para’, nunca ‘acima’ ou ‘contra’.

10. É possível fazer em seu quarto, a sós, aquele exame de consciência, recordando aquelas situações desagradáveis vividas, e pode ser acompanhada do exercício de uma mão fechada que bate no peito e diz: ‘minha culpa... minha tão grande culpa...’. Pode rezar em latim, se achar melhor: ‘mea culpa..’.

11. Uma ginástica que quer reeducar a consciência. Um exercício que cria uma espécie de reflexo condicionado que nos leva a sentir-nos pessoalmente responsável por certas coisas que não foram bem. É preciso muita ginástica para curar em nós essa ‘síndrome de julgamento’, e melhorar as coisas em torno a nós.

12. É verdade, o instinto de julgar em nós é muito forte, é não há como retirá-lo de nós, mas talvez possamos redirecioná-lo a nós mesmos, nossos defeitos, nossas traves. Pouparemos a Deus o trabalho de julgar-nos quando estivermos em sua presença... deixando-lhe tão somente pronunciar a sentença do perdão.

13. No nosso tribunal ambulante e permanente tem lugar para o Crucificado? Será que O observamos e absorvemos? Experimentemos deixa-lo sentar-se conosco.

 Pe. João Bosco Vieira Leite