(Br 5,1-9; Sl 125[126]; Fl 1,4-6.8-11; Lc 3,1-6).
1. Lucas coloca a revelação de Jesus
dentro de uma solene moldura histórica-geográfica-política-religiosa, cheia de
fatos e nomes importantes ao contexto da época. Não é uma simples vaidade
literária, mas para dar uma dimensão histórica e um significado teológico à
essa manifestação. Trata-se de algo decisivo para história humana.
2. Mas esse fato importante não tem seu
início nos palácios dos poderosos; ele vem do deserto. Tudo se encaminha a
partir de um personagem solitário. A aparição do Batista antecipa a missão de
Jesus. A pregação do Batista retoma o tom profético que convida à conversão, ou
seja, a olhar em outra direção.
3. O Senhor está para chegar, todavia é
preciso ir ao seu encontro, antecipar-se, preparando-lhe caminhos, endireitando
veredas. Abaixando montes de autossuficiência, de prepotência, abandonando o
vazio de uma vida sem significado, não se conformando a à própria miséria.
4. A vinda do Senhor é um dom, mas vem
preparado pelo ser humano. João também apresenta a salvação que chega em
caráter universal, sem privilégios ou pretensão de exclusividade.
5. Os dados referidos por Lucas encontram
apoio nos historiadores antigos. Mas sua intenção não é fazer coincidir a
história de Cristo com a ‘grande história’ do ser humano, mas medir a história
humana, de cada ser humano, com essa manifestação de Cristo.
6. Os dados históricos de Lucas podem
permanecer fora do tempo em que nos situamos, se não olhamos para eles a partir
de nossa história pessoal. Essa introdução feita por ele poderia ser
parafraseada por nós, da seguinte forma:
7. “No ano em que o território da minha
vida estava sob o domínio da insignificância e era dividido em zonas de
influências supervisionadas pelo desejo de posse, pela aparência, pelo poder,
pela avidez e pelo orgulho.
8. Quando a minha religiosidade se
resumia às práticas exteriores; quando a Palavra de Deus, exigentíssima, se fez
sentir com raras pausas de silêncio. Naquele momento pude medir toda a minha
existência em sua fragilidade, e inconstâncias sucessivas.
9. Resistindo à tentação de me esconder
em meio à multidão, me encontrei no deserto de uma espoliação dilacerante, de
perguntas comprometedoras, de redirecionamento custosos, de uma libertação
difícil. Sim. Me converti, mudando mentalidade, coração, interesses. Deixei de
olhar tanto para mim, para olhar para um Outro”.
10. Isso é para dizer que a chegada de
Cristo na vida de uma pessoa se manifesta com a reprovação de uma história
precedente e a adoção de uma geografia desconhecida. Só quando iniciamos uma
outra história, quando se inaugura uma nova geografia, é possível dizer que os
dados coincidem.
11. Somente quando a vicissitude de
Jesus se torna a minha vicissitude, quando me vejo ‘contemporâneo’ com a sua
aventura, cumplice de suas propostas, é que permitirei, como João Batista,
deixar que a minha existência seja uma preparação contínua à sua chegada.
Pe. João Bosco Vieira Leite