(Is 58,1-9; Sl 50[51]; Mt 9,14-15)
Depois das Cinzas.
“’Por que não te
regozijaste quando jejuávamos e o ignoraste quando nos humilhávamos?’
É porque, no dia do
vosso jejum, tratais de negócios e oprimis os vossos empregados” Is 58,3.
“De sã consciência,
ninguém poderia dizer que o povo da Palestina, ali pelo século VII ou VI a.C.,
não tinha religião. Tinha e muito. Templo cheio, sacrifícios de animais e até
jejuns justificavam que a religião tinha entre o povo a mais alta consideração.
E que a religião é um negócio relacionado em última análise com Deus, ele
deveria estar superfeliz. Mas não estava. O seu desconforto era tamanho que o
próprio povo, através do profeta, acabou sabendo. Daí a sua queixa de quem se
sente não só abandonado, mas acima de tudo desprezado e traído. Por que Deus
agiu de forma tão contrária ao esperado em relação a um povo que não
economizava devoção e devoção das boas como jejum e mortificação? Teria Deus
perdido a sensibilidade? Acontece que Deus não é um narcisista que precise o tempo
todo de bajulação. Deus não precisa sequer da nossa boa obra, seja ela de que
tipo for, menos ainda de cunho puramente ritual. Se ele, porém, não precisa das
nossas boas obras, o nosso próximo precisa e muito. Aí é que está a questão.
Jejum e sacrifícios eram feitos naquele tempo como desculpas antecipadas para
enganar e oprimir o pobre. Desse modo, o próprio Deus era convocado como
cúmplice da injustiça e opressão. E isso ele não fez em hipótese alguma.
– Deus, tu nos ama e redimes, queres de nós um culto perfeito que leve
em conta as necessidades do próximo. Quando, pois, eu olhar para o alto faze-me
também olhar para o lado. Amém” (Martinho Lutero e Iracy Dourado
Hoffmann – Graças a Deus [1995] – Vozes).
Pe. João Bosco Vieira Leite