Sábado, 22 de fevereiro de 2020


(1Pd 5,1-4; Sl 22[23]; Mt 16,13-19) 
Cátedra de São Pedro.

“Simão Pedro respondeu: ‘Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo’” Mt 16,16.

“É Jesus verdadeiramente o Filho de Deus? Eis o gênero de questão cujo enunciado parece bem simples, mas que não tem sentido algum, separada do contexto global do Evangelho. Feita a pergunta, por exemplo, a um muçulmano, ele responderá logo: impossível! A quem, com efeito, concebe Deus como único e transcendente, é impensável associar-lhe um ‘filho’ ou lhe atribuir não sei que ato carnal ou mítico de geração. Essa ideia, aliás, estava longe do pensamento dos próprios discípulos de Jesus, quando começaram a ligar-se a ele. O que, entretanto, era notável para eles, é que a expressão ‘filho de Deus’ fazia parte do vocabulário das Escrituras. Esta metáfora significava relações aparentemente mais estreitas entre Deus e tais de suas criaturas: os anjos eram por vezes designados assim, frequentemente o próprio povo de Israel, e finalmente o rei que simbolizava mais particularmente a fidelidade de Deus por seu povo. No tempo de Jesus, a expressão ‘filho de Deus’ fazia, pois naturalmente parte da panóplia de títulos atribuídos ao Messias. É nesse sentido que se deve compreender a palavra do demônio na cena da tentação: ‘Se és o Filho de Deus, ordena a essas pedras que se mudem em pão’, ou a questão de Caifás: ‘Es tu o Cristo, o Filho Bendito?’ O sentido da expressão podia, pois, ser tão ambíguo como a concepção do messianismo que lhe era subjacente. É por isso que Jesus não reivindicou, sem mais nem menos, esse título. Foi por uma outra via que ele deixou suspeitar o mistério real da sua pessoa: falando cada vez mais abertamente de Deus como seu Pai, revelando a intimidade das suas relações com ele, numa palavra, deixando reconhecer a filiação divina que ele vivia em todas as fibras do seu ser, e que ele manifestava não pela especulação sobre títulos, mas por atos de Filho. Foi S. João que melhor reuniu e concentrou no seu Evangelho esses múltiplos traços que desenham a fisionomia autêntica e o mistério inaudito d’Aquele que os seus, pouco a pouco aprenderam a conhecer como Filho de Deus. Mas essa suprema confissão, que basta para fazer o cristão, pode ser preparada para tais sinais e palavras, pode tornar-se pensável e plausível para o espírito: ela só se tornará certeza e grito de fé, quando e porque Deus mesmo consuma, dentro dos corações, ‘a revelação, em nós, do seu Filho’, como diz S. Paulo (Gl 1,16). Por isto a Igreja sempre considerou como certidão de seu nascimento a confissão da fé de Pedro em Cesaréia: ‘Tu és o Cristo, o Filho de Deus Vivo’ (Mt 16,16). Aí ela escuta com clareza o que Pedro, no princípio, só podia compreender obscuramente, e ela sabe que poder dizer isto não provém ‘bem da carne, nem do sangue, mas do Pai’ de Jesus Cristo. Porque ‘ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho quiser revelar’ (Mt 11,27)” (A. M. Besnard – Fêtes et Saisons – Editora Beneditina Ltda.).

Pe. João Bosco Vieira Leite