29º Domingo do Tempo Comum – Ano A

 (Is 45,1.4-6; Sl 95[96]; 1Ts 1,1-5; Mt 22,15-21)

1. O Evangelho de hoje termina com uma daquelas frases lapidares de Jesus que deixaram um sinal profundo na história: “Dai a Cesar o que é de Cesar e a Deus o que é de Deus”.

2. Estamos em mais uma dessas situações em que dois grupos rivais se unem contra Jesus. Os fariseus eram nacionalistas, contrários ao domínio romano, os herodianos, por sua vez, colaboracionistas e apoiavam o poder romano. Assim, ou Jesus se posicionava a favor do povo ou dos romanos.

3. Jesus manda tudo pelos ares com uma resposta que põe o problema num nível infinitamente mais profundo e universal. Não é mais ou Cesar ou Deus, mas um e outro, cada um em seu plano. Se seus adversários trazem consigo uma moeda romana, admitem implicitamente que algo lhes é favorável do poder imperial.

4. Os hebreus concebiam o futuro Reino de Deus instaurado pelo Messias como uma teocracia, isto é, um governo diretamente de Deus sobre toda terra e todos os povos. Mas Jesus deixa transparecer que o Reino de Deus não é deste ou daquele modo, mas que em sua amplitude pode coexistir com qualquer outro regime, seja do tipo sacro ou laico.

5. Porém, Cesar e Deus não são colocados sobre um mesmo plano, porque Cesar depende de Deus e deve prestar conta a Ele. As Escrituras deixam isso bem claro. Não estamos divididos entre duas pertenças; não somos constritos a servir a ‘dois patrões’. O cristão é livre para obedecer ao estado, mas também de resistir a esse quando se coloca contra Deus e sua lei.

6. Paulo deixa claro em sua carta aos Romanos (13,1ss) o dever de obediência ao governo em voga, mesmo este não sendo favorável aos cristãos. Pagar impostos para um cristão, e mesmo para qualquer pessoa honesta, é um dever de justiça. Em contrapartida, o estado deve prover os serviços necessários aos cidadãos.

7. Durante os três primeiros séculos da era cristã, não houve participação ativa dos cristãos na política. Estes viviam dispersos e mais ocupados com a expansão do cristianismo. Será em 313, com o edito de Constantino que os cristãos vieram não somente a ser tolerados e com o tempo também detentores de poder.

8. A liberdade para a vivência do cristianismo é alcançada em todos os setores, mas traz consigo vários riscos graves: intolerância, abuso de poder, abandono da simplicidade e radicalidade evangélica, etc. É nessa época que muitos cristãos começam a deixar as cidades e se refugiarem em lugares desertos, dando origem ao monaquismo. 

9. Sabemos, ao longo do tempo, dos inconvenientes desse abraço estreito entre Cesar e Deus, entre religião e política, e o descrédito que acaba repercutindo na missão da Igreja, os ressentimentos e os obstáculos para a evangelização.

10. Hoje, os cristãos vivem espalhados em todas as realidades e componentes políticos da sociedade, com a possibilidade de serem, de maneira bastante discreta, mas eficaz, ‘sal da terra’ e ‘fermento na massa’. Nesta situação, a colaboração dos cristãos se faz necessária na construção de uma sociedade justa e pacífica e sobretudo em torno de valores comuns, como a família, a defesa da vida, a solidariedade com os mais pobres, a paz.

11. A grandeza de um político se mede sobretudo pela sua capacidade de saber deixar em segundo plano os interesses pessoais. ‘Político’, vem de pólis, aquele que está a serviço da cidade, do estado, não da sua família e dos seus próprios interesses. Sabemos onde reside a raiz de vários problemas em nossa sociedade.

12. Contribuímos com a restauração de nossa sociedade política não somente com o voto, mas também com a oração. Na 1ª Carta a Timóteo (2,1ss), Paulo recomendava a oração por todos que estão no poder, para que tenhamos uma vida calma e tranquila com toda piedade e dignidade. Será que nós lembramos de incluir essa classe em nossas orações?  


Pe. João Bosco Vieira Leite