(Dt 18,15-20; Sl 94[95]; 1Cor 7,32-35; Mc 1,21-28)
1. Jesus
ensina e age com autoridade. Proclama e age. Palavra e ação, palavras e fatos
brotam do seu ministério. Assim acompanhamos essa cena do evangelho onde o ensinamento
de Jesus provoca admiração, pois percebem logo a diferença entre o falar de
Jesus e dos escribas, mestres autorizados daquele tempo.
2. A
autoridade de Jesus não vem de um posto que ocupa, não é profissional ou
institucional, ela vem do alto ou melhor, de dentro de si mesmo. Em Cristo a
mensagem ‘se faz corpo’ em seu ser. Sua autoridade empalidece a dos demais,
porque sua autoridade é sinônimo da sua liberdade.
3. Sua
autoridade vem exercitada não somente no ensinamento, mas também na ação, por
isso o milagre da libertação do endemoniado. Assim Marcos deixa claro que a
Palavra de Jesus é ação e poder. Deixando ainda mais admirada a multidão.
4.
Compreendemos que Deus é presente e age no mundo seja através do ensinamento,
da pregação, seja através da palavra que cura, que faz acontecer algo. Mas em
Marcos, o 1º milagre de Jesus se refere a libertação de um possesso, diferente
de João, que transforma água em vinho num casamento (Jo 2,1-11).
5. O leitor
atento vai perceber que em Marcos a expulsão de demônios ocupa um posto
relevante. E certamente nos sentimos um pouco embaraçados. A mentalidade
moderna tem dificuldade de ‘engolir’ tais episódios, pois temos um mínimo de
conhecimento científico das coisas.
6. Para a
mentalidade primitiva, muitas doenças, especialmente aquelas mentais, vinham
atribuídas ao influxo ou a ‘possessão’ de espíritos maus ou demônios. Essa
ideia se estendia até mesmo às limitações físicas, como o mutismo, a surdez, a
cegueira, a paralisia e a epilepsia.
7. Sobre
esses fenômenos não se fala tanto de pecado, nem se faz um juízo moral sobre o
indivíduo. São simplesmente vítimas de forças malignas. Hoje, em certos casos,
falamos de epilepsia, histeria, crise maníaco-depressiva, esquizofrenia. Invés
de ‘endemoniado’ poderíamos dizer ‘paranoico’.
8. Mas
Jesus não se dissocia da mentalidade do seu tempo, parece mesmo partilha-la,
não adverte de tratar-se de causas naturais. É fato que Jesus não veio abrir
estrada à psiquiatria moderna. O ser humano deve fazer seu próprio caminho e
conduzir suas pesquisas para estabelecer as causas dos males.
9. Jesus
faz uma leitura ‘teológica’, não científica da situação que tem diante de si.
Ele se encontra diante de alguém que não é ele mesmo, é desagregado, ocupado
abusivamente por um outro. O diagnóstico de Jesus não é de ordem médica, ele
não vislumbra as causas, mas o inimigo comum a Deus e ao ser humano.
10. Marcos
apresenta Jesus como aquele que caça, expulsa o ocupante abusivo, que age
contra as forças do mal, para retomar o território. E o faz com uma palavra
simples, diferente da prática de exorcismo de seu tempo. E o espaço antes
habitado pelas forças do mal, torna a ser habitado pelo próprio homem, espaço
de liberdade, lugar de comunhão.
11. Essa
expressão: ‘um homem possuído por um espírito mal’, nos faz refletir, sob a
ótica de Cristo, em sua raiz, sobre todas as forças que impedem o ser humano de
ser humano. Denunciá-las e exorciza-las. Uma função não só da Igreja, mas de
todos nós. Tudo que atenta à dignidade do ser humano constitui uma blasfêmia
contra a glória de Deus.
12. Se luta
por Deus quando nos colocamos concretamente da parte de sua criatura. O inimigo
é comum. Nossa palavra não deve ser clara e intransigente somente quando se
trata de ‘salvaguardar’ a doutrina moral. Ainda que alguns achem que não
devemos nos meter em determinados assuntos. O que diz respeito ao ser humano,
diz respeito ao próprio Deus. Assim age Jesus, em palavras e ações, a favor do
ser humano.
Pe. João Bosco Vieira Leite