Domingo de Ramos – Ano A

(Mt 21,1-11; Is 50,4-7; Sl 21[22]; Fl 2,6-11; Mt 27,11-54)

1. Nesse domingo, que chamamos de Ramos, recordamos a entrada solene de Jesus em Jerusalém e assim somos introduzidos na Semana Santa com a leitura da narrativa da Paixão. Toda a narrativa é articulada em torno do tema da cruz. A cruz é o ponto culminante da obra de salvação realizada por Cristo. Mas a cruz é também a dimensão fundamental da existência cristã.

2. A cruz tem uma função insubstituível na construção desse ‘homem novo’, no dizer de Paulo. Mas é importante que cada cristão seja consciente e aceite de maneira livre e amorosa, sem toma-la de maneira sofrida e sem se vitimar. Talvez simplesmente abraça-la, como faz o Cristo. “Uma cruz que se carrega é melhor que uma cruz que se arrasta” (Sta. Teresa).

3. Nessa dimensão cristã, preciso ser consciente que a cruz precisa de duas presenças, nunca a carrego sozinho. Uma cruz solitária é desumana. É a cruz que se carrega junto que nos faz entrar no dinamismo da redenção. Na cruz cristã, a nossa frente, na outra extremidade, está o próprio Jesus.

4. A cruz antes de ser minha, é d’Ele. Em cada cruz está Cristo. A nós vem proposto que carreguemos juntos. Essa é a linha divisória que separa aquele que vê a cruz como realidade concreta, inevitável, como sofrimento pessoal, e a outra que vê a cruz como um sofrimento participativo.

5. É uma questão do olhar. Há quem veja somente o madeiro que lhe pesa às costas, e tudo termina aqui. Mas há quem veja as costas de Alguém que lhe está à frente e tudo vai terminar ali.

6. Assim, qualquer situação dolorosa não é algo que só me diz respeito, mas é algo que nos diz respeito. Tudo aconteceu antes a Ele. O que me é oferecido é ser participante e protagonista juntamente com Ele.

7. Comumente, se algo de ruim nos acontece, procuramos logo alguém para desabafar. E deixamos de voltar-nos unicamente Àquele que é capaz de compreender melhor do que ninguém, pois Ele mesmo a provou. Por que não desabafar com Ele, nosso companheiro de cruz. Que nos pode oferecer a piedade dos outros? Não aqui desconsiderando os métodos terapêuticos necessários para atravessar certos momentos da nossa vida. Mas o que está em primeiro lugar?

8. Quantas vezes, diante de certos sofrimentos, rezamos instintivamente: “Senhor, ajuda-me a carregar com paciência essa minha cruz”. Jamais pensamos em rezar de modo justo: “Senhor, não me deixe faltar a força (e o amor) para ajudá-lo a carregar esta cruz que se abateu sobre mim”. Só para lembrar que Ele já a está carregando conosco.

9. Essa realidade está aqui prefigurada na imagem de Simão, de Cirene, o especialista em cruz compartilhada. Justo ele, que vinha do trabalho, já com seu cansaço e suas preocupações, que queria só chegar em casa, escapar por alguma brecha daquela multidão, passar invisível...

10. Eis que o alcançam. Não tem como escapar. Sente também as pernas de chumbo, o peso sobre as costas, a energia que se vai, pensa em si, mas ao levantar o rosto contempla um Outro que o convida a segui-lo, com um olhar de quem entende o que está acontecendo.

11. Quem é o Cireneu nessa história? Aquele que ofereceu ajuda ou aquele que a está recebendo? Será que foi o Cirineu que se encontrou com Cristo na estrada ou providencialmente foi Cristo que se colocou na dele? De quem é a cruz, de Cristo ou do Cirineu? Em meio a essa confusão de cruzes é que se pode ir muito além.... O importante é saber que não estou só...

 Pe. João Bosco Vieira Leite