(Is 7,10-14; Sl 23[24]; Rm 1,1-17; Mt 1,18-24)
1. Ontem comentávamos a relação entre os textos
bíblicos desse 4º domingo do Advento. Gostaria de me reter nessa última frase
do anjo ao revelar os planos de Deus a José: ‘Ela dará à luz um filho, e tu lhe
darás o nome de Jesus, pois ele vai salvar o seu povo dos seus pecados’.
2. Pecado é uma palavra que parece rejeitada há
certo tempo, mesmo no vocabulário de vários crentes. Uma moeda sem valor que só
serve ao interesse arqueológico de certos pesquisadores de tabus religiosos.
Mas o grande problema consiste no saber como reencontrá-lo. Será que alguém se
interessaria por isso?
3. Antes de tudo, o pecado não é visto simplesmente
como transgressão de uma lei arbitrária. A estrada do ser humano não é
pontilhada de cartazes com os dizeres: faça isso, não faça aquilo. Na estrada
do ser humano está, antes de tudo, um Deus que quer travar uma relação de
amizade.
4. Um Deus que propõe o seu amor. A única proibição
é a de não amar. Um único mandamento: ama! Mas o ser humano, desde o 1º
instante, aprendeu a dizer não à amizade com Deus, rejeitando suas propostas de
amor. A solenidade da Imaculada nos recordava aquela pergunta de Deus a Adão:
‘Onde estás?’
5. O ser humano não está onde deveria. Este é o
pecado. Adão foi esconder-se. Rejeita o encontro, o diálogo, a amizade. Vira as
costas ao amor. E depois irá pelas estradas mais desoladas da terra
desperdiçando o patrimônio paterno. Para sentir-se livre, se liberta de Deus.
Se distancia também de si mesmo. Incapaz de amar.
6. Na língua hebraica, o verbo que traduzimos como
‘pecar’ significa, literalmente, ‘perder a marca’, ‘errar o alvo’. Uma meta não
atingida. Nesta perspectiva, pecar não é somente, de maneira genérica, fazer o
mal, mas fazer-se o mal. O pecado seria aquilo que impede a nossa realização.
Que desfigura a nossa identidade.
7. Em cada ação humana, a pessoa é chamada a
construir-se na doação e na comunhão com Deus e com os outros. Por isso, todo
pecado, rejeição dessa comunhão, é uma rejeição de construir-se. É um não
querer crescer, não realizar a própria missão. É mais grave ignorar um chamado
que violar uma regra.
8. Na proximidade do Natal, o nosso Evangelho nos
precisa o motivo essencial da vinda de Jesus em nosso meio: ‘salvar o seu povo
dos seus pecados’.
9. No seu comentário à narração bíblica da criação,
Santo Ambrósio diz algo interessante: ‘Agradeçamos a Deus por ter levado a
cumprimento uma obra que depois da mesma pudesse descansar. Fez os céus, e não
leio que tenha repousado. Fez o sol, a lua, as estrelas, e não leio que tenho
repousado. Mas leio que fez o homem e então repousou, tendo finalmente alguém a
que perdoar os pecados’.
10. Mas, e tem sempre um ‘mas’, é necessário que
esse alguém esteja disposto a deixar-se perdoar. E reconheça de ter algo a
pedir perdão. Deus não desculpa o pecado, não passa a mão em nossa cabeça
dizendo que não somos culpados. Nos busca enquanto culpados, para perdoar-nos.
11. Admitir a nossa culpa, significa reconhecer a
nossa dignidade, liberdade, o nosso ser autônomo. Um certificado de grandeza. E
não será mal prepara-nos ao Natal reafirmando esta verdade elementar: Ele veio
procurar os pecadores. (E aqui estamos nós...).
Pe. João Bosco Vieira Leite