(Sb 9,13-18; Sl 89[90]; Fl 9-10.12-17; Lc 14,25-33).
1. ‘Grandes multidões seguem Jesus’,
nos diz Lucas. E Jesus precisa esclarecer algumas coisas. Suas admoestações nos
trazem três lições fundamentais para qualquer aventura espiritual: constância,
realismo e audácia. De modo negativo podemos dizer que há três perigos nessa
estrada: veleidade, presunção e timidez.
2. Constância. É
preciso convencer-se que uma aventura espiritual é digna deste nome quando é
sustentada por uma vontade de leva-la até o fim. Estamos dentro de um terreno
em que não nos é consentido fazer as coisas pela metade. Uma obra interrompida
não constitui a metade da obra, mas sim um fracasso, nos diz o evangelho.
3. As coisas feitas pela metade não ficaram
pela metade. Elas não são nada. Veleidade é próprio de quem não sabe exatamente
o que quer, onde quer chegar e porquê. Sempre em busca de novas emoções, mais
que compromisso sério. Entusiasmo passageiro, meio exibicionista. Instável. A
vida cristã deve revelar uma vontade de chegar até o fim.
4. Realismo. Sentar-se
e considerar atentamente as coisas, avaliar os riscos, calcular os meios
necessários. Em uma palavra: estudar a situação. Quando eu falo em aventura
espiritual, aventura aqui não significa inconsciência ou mesmo presunção.
Realismo aqui não está em contradição com o espírito de fé.
5. Tendo fotografado a situação, e
sondado a própria realidade interior, com o coração, fôlego e as pernas que
possuo, posso legitimamente esperar chegar até o fim? Com a atual força
espiritual, com esta ração de oração, com essa dose de meditação, sou
autorizado a crer de saber lidar com as dificuldades?
6. ‘Sentar’ significa conhecer os
objetivos que se espera atingir. Significa conhecer-se. Ou seja, examinar
realisticamente o próprio equipamento interior.
7. Audácia. Se esse
inventário que fizemos da nossa realidade mais profunda nos leva a uma certa
desconfiança de nós mesmos, e assim a evitar o risco de uma presunção que pode
conduzir a desastrosas consequências, devemos também evitar o risco oposto: uma
timidez excessiva que nos feche numa prisão de renúncia, sem que jamais ousemos
transpor os seus muros, e tentar, experimentar, buscar...
8. Muitas vezes perdemos certas
batalhas porque em nós não aflora sequer o desejo de combatê-la. De cara já nos
consideramos derrotados. Há sempre uma tentação sutil, diabólica, de redução
dos ideais às nossas forças, às nossas fragilidades.
9. Na realidade deveríamos proporcionar
às nossas forças à altura e amplitude dos nossos ideais. Se devo chegar a
determinado objetivo, não posso me dar por satisfeito. Então devo rezar mais,
refletir mais, buscar mais coragem, fazer mais sacrifícios, ser mais decidido (...).
Devemos fazer que os fins produzam os meios e não o contrário.
10. A paradoxo cristão pode ser
expresso assim: a distância da meta, a dureza da estrada e o fascínio daquilo
que desejo atingir devem produzir a velocidade e a força da máquina. E quando
se trata de Deus, só a atração da meta já é suficiente para criar a estrada.
11. A audácia do que falo não está em
contradição com o realismo. De fato, mesmo depois de um inventário nada
grandioso, podemos salvar-nos batendo na porta Daquele que deseja tão somente
investir seu capital infinito em ações que merecem o seu aval.
12. Deus, antes de financiar as nossas empreitadas
examina atentamente os nossos projetos. Se é algo pequeno, infantil, talvez não
lhe interesse. Mas se lhe apresentamos algo difícil, desafiador, Ele ficará
agradavelmente surpreso. E se fará nosso ‘cúmplice’, nosso sócio nessa
empreitada.
Pe. João Bosco Vieira Leite