(Hb 9,15.24-28; Sl 97[98]; Mc 3,22-30)
3ª Semana do Tempo
Comum.
“Os mestres da lei,
que tinham vindo de Jerusalém, diziam que ele estava possuído por Belzebu e que
pelo príncipe dos demônios ele expulsava os demônios” Mc 3,22.
“A estrutura de
‘sanduiche’ (em que duas narrativas são encaixadas de tal maneira que uma serve de
moldura à outra), que é típica para o Evangelho de Marcos, estabelece uma
ligação entre as duas visitas dos parentes de Jesus e as acusações dos escribas
de que Jesus era possuído por Belzebu. Marcos aproveita essa composição do
texto para expressar uma verdade teológica: até os parentes mais próximos de
Jesus correm o risco de demonizar Jesus. É a forma mais sutil de rejeição:
recorrer à patologização do adversário. O outro é apresentado como doente
psíquico, como possuído pelo demônio. Essa atitude dispensa maiores atenções e
análises. [...] Estes acusam Jesus de estar possuído por Belzebu e de expulsar
os demônios com a ajuda do chefe dos demônios. Os exegetas não são unânimes
quanto ao significado da palavra Belzebu. É provável que signifique ‘senhor da
casa’, o seja, o chefe dos demônios que comanda a casa dos demônios. Como os
familiares de Jesus, os fariseus também se recusam a analisar seriamente a
mensagem de Jesus. Preferem falar mal dele, acusando-o de estar mancomunado com
os demônios. Até hoje é esse o método usual para manter opiniões divergentes a
distância. Estas são qualificadas de produtos de alguma doença psíquica, de
modo que dispensam qualquer envolvimento mais sério com as respectivas palavras
ou atos. Tudo não passa de manifestação dessa doença. Jesus não aceita esse
papel de doente mental possuído pelo demônio. Ele refuta seus adversários
contando uma parábola: ‘Como é que Satanás pode expulsar Satanás? Se um reino
está dividido contra si mesmo, esse reino não pode se manter’ (3,23-24). Assim
ele mostra que as acusações dos escribas são absurdas. Porque, nesse caso, os
demônios já não possuiriam poder nenhum. Mas o que vale para a casa dos
demônios aplica-se também à família. Uma família dividida contra si mesma não
poderá subsistir (3,25). Trata-se de uma advertência dirigida à comunidade
cristã. Para Marcos, essa associação das duas visitas da família com a acusação
da possessão demoníaca vai além do confronto de Jesus com sua família original.
Ele visa sobretudo o perigo que ronda a comunidade cristã: a divisão. O risco
maior vem do fungo esquizogênico disseminado pela acusação de que membros da
comunidade estariam mancomunados com os demônios, de que sua pregação e seu
comportamento obedeceriam a ordens vindas dos demônios. Jesus chama essa
atitude dos escribas de pecado contra o Espírito Santo. Quem afirma a respeito
de um outro, que o deixa inseguro, que é possuído por um espírito impuro peca
contra o Espírito Santo que fala por intermédio dele. Uma pessoa dessa age
contra sua consciência, pois em seu íntimo sabe bem que o outro tem uma
mensagem importante que precisa ser encarada. Mas ela se nega a enfrentar o
desafio representado pelo outro. Prefere taxá-lo de doente mental” (Anselm
Grun – Jesus, Caminho para a Liberdade – Loyola).
Pe. João Bosco Vieira Leite