(Is 29,17-24; Sl 26[27]; Mt 9,27-31)
1ª Semana do Advento.
“Então Jesus tocou
nos olhos deles dizendo: ‘faça-se conforme a vossa fé’ Mt 9,29.
“Dois homens são
curados, os dois por contato. A cura não é imediata, mas só depois de um novo
pedido. E antes de dar-se a cura, há uma conversa inusitada entre os dois
homens. A conversação entre Jesus e o cego se torna o elemento central. O tema
da fé salvadora, implícita desde o começo, no fim emerge explicitamente por
meio da introdução à afirmação em 9,29 ‘tua fé merece isto, assim será feito
para ti’, uma a firmação que não aparece em Mt 20 ou nos paralelos de Marcos e
Lucas. Por meio de uma série de inspiradas adaptações Mateus mudou uma narração
descritiva de um milagre, para características altamente individualistas, em
uma cena ideal, uma espécie de paradigma, ilustrando a ligação entre fé e
milagre. Mesmo uma leitura superficial das histórias-milagres em Mateus mostra
que a fé é sempre anterior e não consequente do milagre. O milagre não suscita
a fé ou lhe serve de base. O milagre não é explorado como propaganda. As
histórias-milagres podem ter sido usadas na pregação cristã primitiva como meio
de conversão do descrente, mas isso não está refletido no primeiro Evangelho. A
ligação entre fé e milagre não pode ser explicada exclusivamente em termos
psicológicos, como se a fé fosse simplesmente uma suscetibilidade psíquica.
Algumas vezes, por exemplo, a fé em questão não é da pessoa doente, mas a de
parentes ou amigos (cf. o servo do centurião, o paralítico, a filha do
oficial). Também não se dirá que essa fé é simples confiança no poder milagroso
de Jesus. Nas histórias de milagres, a fé sugere, não uma disposição interior,
mas a manifestação dessa disposição. Em Mateus 9,2 Jesus ‘vê’ a fé dos amigos
do paralítico. Essa fé aparece na ação que promove um encontro com Jesus. É bem
definida por Held como ‘uma enérgica e importuna procura do auxílio de Deus’.
Na maioria dos casos esta fé ativa precisa de desenvolver e alcançar seu fim em
face de dificuldades especiais. Nem as diferenças nacionais (centurião) nem as
multidões que atropelam (o paralítico) podem impedi-la. O milagre é sempre uma
resposta a esta fé. É sempre apresentado como a realização de um desejo
manifestado. Assim, não há conexão causal entre fé e milagre, mágica ou
psicológica, exceto no sentido que uma pergunta pode ser causa de uma resposta.
Mateus muitas vezes traz à tona a conexão íntima entre pedido e resposta, mas
nunca sugere que o pedido necessita resposta. Podemos ver por outro ângulo a
relação entre fé e milagre. Os milagres de Jesus eram ambivalentes. Nunca eram
provas que necessitassem do consentimento da sua audiência. Eram sinais que
podiam ser interpretados de modos diversos. Tanto podiam ser aceitos como
recusados. De outra maneira é impossível explicar as hesitações dos discípulos,
cuja fé variável é perceptível até a Ressurreição. Não temos o direito de
assumir que a fé era fácil em qualquer tempo – menos ainda durante o ministério
de Jesus” (J. Murphy e Ó Connor – Milagres em Mateus –
Paulinas).
Pe. João Bosco Vieira Leite