(1Jo 2,18-21; Sl 95[96]; Jo 1,1-18)
Oitava de Natal.
“No princípio era a
Palavra, e a Palavra estava com Deus; e a Palavra era Deus” Jo 1,1.
“O prólogo do
Evangelho de São João é incontestavelmente a mais profunda das páginas da
história que jamais foi escrita. Os maiores gênios se esforçaram por
penetrá-la... E, no entanto detiveram-se no primeiro limiar do abismo que
contemplava São João. E pode-se dizer que ele mesmo, o discípulo amado, cujo
olhar de águia passara a vida face a este abismo, pode-se dizer que tenha
ultrapassado a beira desse abismo? Convém lembrarmos sempre disso quando lemos
a Sagrada escritura e principalmente este prólogo do quarto evangelho onde mais
contemplativo – por ser o mais amante – dos escritores sagrados, resumiu em
algumas linhas preliminares a história daquele que era ‘Luz e Vida’. Estas
linhas são apenas uma veste humana, veste curta demais – inexprimivelmente
curtas demais – de realidades que ultrapassam a todos para sempre. Quando as
meditarmos longamente com toda a alma e durante toda a vida, as perspectivas
que elas abrem se estendem cada vez mais, e, numa luz cada vez mais intensa –
tão fresca e sempre tão jovem – revelam um mundo que se desdobra além de tudo o
que se vê e de tudo o que se diz. É a alegria – às vezes inebriante, sempre
suave e incomparável – desta meditação: o que ela dá nada é; o que promete é
muito mais: ‘Os que me comem terão sempre fome, os que me bebem terão sempre
sede’ (Eclo 24,21). Isso é profundamente verdadeiro. Deus, sua verdade, sua
vida, sua beleza, toda sua plenitude sem nome que nossas palavras se esforçam
em vão por traduzir, é um alimento que nutre sem saciar. São João, no início do
seu Evangelho, nos coloca imediatamente nessas alturas, em face do Verbo,
daquele que era quando tudo começou, por quem tudo começou. Ele tem razão: tal
é Jesus, antes de tudo. É nessa luz somente que se percebe bem isso: ‘Luz
verdadeira que ilumina todo homem que vem a esse mundo’ (Jo 1,9). Foi para
contemplar essa luz que Jesus convidou o discípulo bem-amado acompanhado por
André desde a primeira entrevista. ‘Mestre, onde habitas?’ (Jo 1,38)
perguntaram-lhe os dois discípulos de João Batista ao quais o Precursor havia
dito, mostrando-o: ‘Eis o Cordeiro de Deus’. – ‘Vinde e vede’, respondera
simplesmente o Senhor. E ele os levara consigo. Onde habitava ele? O
evangelista no-lo diz. Sua verdadeira resposta está contida na primeira palavra
do seu Evangelho. A habitação de Jesus, é o Verbo; nele foi são João
introduzido desde o primeiro dia. E aí permaneceu. E é até aí que ele nos
conduz por sua vez. Sigamo-lo e permaneçamos aí com ele” (A. Guillerand – No
Limiar do Abismo de Deus – Benedettine di Priscilla – Roma).
Pe. João Bosco Vieira Leite