(Zc 9,9-10; Sl 144[145]; Rm
8,9.11-13; Mt 11,25-30)
1. Há uma enfermidade que atinge a todos a certa altura do caminho. Uma
doença estranha, ao menos em suas causas. Ela se chama cansaço.
2.Há o peso da estrada já percorrida que se faz sentir. O peso dos
incidentes da viagem, das desilusões, das incompreensões, dos insucessos. O
peso das pessoas, de um ambiente mesquinho, das injustiças, da falsidade, da
desconfiança.
3. Tudo isso vai se acumulando, e mais que esmagar-nos, nos entorpece,
embaça a vista, nos esvazia e nos suga as energias. E por isso a estrada perde
todo o interesse. Aliás, o único interesse é encontrar um lugar onde alojar o
próprio cansaço. E desligar-se.
4. Não há o desejo de mais nada, a não ser o de ‘deixar-se levar’, pois
nada parece valer a pena. Há algum sentido em tudo isso? Por que vou eu
perturbar a tranquilidade dos outros? Que se ganha sendo sincero? Melhor
colocar-se no meu canto. Já tenho meus próprios problemas...
5. Essa experiência que pode nos assaltar, foi vivida muito séculos
atrás pelo profeta Elias, e ela tem um valor simbólico para todos nós em todos
os tempos (cf. 1Rs 19,4-8). Alguns de nós precisamos de uma árvore sob a qual
possamos distender nosso próprio cansaço e adormecer. A árvore da resignação,
da abdicação, da mediocridade, da facilidade, da indiferença...
6. Qual é a resposta que Deus dá ao cansaço de Elias? Não é uma resposta
consoladora, não obstante as aparências. Há uma preocupação de Deus com Ele,
providenciando o comer e beber. Mas tem uma proposta que soa provocadora:
“levanta-te e come pois tens uma longa estrada por percorrer...”
7. Deus o livra da doença do cansaço adotando uma cura demasiadamente
insólita: Ele diz que o cansaço não vem do que foi feito, mas do que ainda
resta fazer, não pela estrada já percorrida, mas por aquela que ainda nos resta
percorrer. Somos cansados por não mover-nos, por aquilo que ainda não
trabalhamos.
8. Depois desse surpreendente e escandaloso diagnóstico do mal, Cristo
nos oferece também um alívio: “Vinde a mim todos vós que estais cansados e
fatigados... e eu vos darei descanso”. Finalmente!
9. E logo acrescenta: “Tomai sobre vós o meu jugo...”. Não parece ser a
melhor maneira de curar o cansaço. Longe de aliviar-nos com seu afeto, o Senhor
nos presenteia com o seu jugo. E mesmo se é ‘suave’, é sempre um jugo. Parece
que algo nos é acrescentado. Ainda que ‘leve’.
10. Diferentemente de Elias, o pão que nos é oferecido é o próprio
Jesus. Ele é a própria estrada. ‘Eu sou o pão vivo...’ ‘Eu sou o caminho’.
Alimentando-nos d’Ele, alimentamo-nos da nossa estrada. A estrada é o nosso
alimento, a estrada é o remédio do nosso cansaço. Não atoa o cristianismo
inicial era conhecido como “O Caminho”.
11. “Levanta-te e come, porque o caminho é longo”. Deus não nos permite
dormir, não nos permite embalar o nosso cansaço. Caminhemos, então. Quanto mais
longa e desafiadora a estrada por percorrer, mais tempo e disposição teremos
para deixar para trás o cansaço... É isso que nos propõe o
Senhor.
Pe. João Bosco Vieira Leite