(1Rs 3,5.7-12; Sl 118[119]; Rm 8,28-30; Mt 13,44-52)
1. Jesus se serve de diversas
imagens para descrever a realidade misteriosa do Reino de Deus. O Reino vem
comparado a uma semeadura, a uma porção de fermento na massa, à descoberta de
um tesouro escondido, à busca de um comprador para possuir uma pérola preciosa
etc.
2. Tantas imagens. Menos aquela
que gostaríamos. Que o Reino nos viesse apresentado como um fenômeno a ser
contemplado, uma coisa já pronta que está ali à nossa disposição, somente para
ser consumido...
3. Na perspectiva de Jesus, o
Reino representa uma realidade dinâmica, não estática. Se trata de buscar,
caminhar, ocupar-se, escolher, decidir, sacrificar algo, esforçar-se. Como bem
representam essas duas primeiras parábolas de hoje sobre a nossa pertença ao
Reino. Justamente o que não queremos.
4. Parece que o ponto de partida
é a descoberta. Mas essa é precedida pela busca, uma exploração; poderíamos
dizer, uma paixão. A verdade é oferecida a todos. Mas não vem colocada à
disposição numa bandeja. Buscar constitui a condição essencial para encontrar.
O coração deve arder de desejo para que o dom seja alcançado.
5. E não se trata de uma
descoberta marginal, mas de algo essencial, que pode mudar uma vida, determinar
uma mudança imprevista, dar um sentido totalmente diferente à existência. É uma
conversão. A descoberta de um todo, capaz de preencher a vida do ser humano.
Não um elemento acessório, para juntar-se a tantos outros...
6. O segundo aspecto que nos
traz as parábolas é o de uma escolha precisa. Tanto é importante a descoberta,
quanto é importante a escolha. A avaliação sobre o valor do tesouro sobre o
qual repousamos o olhar deve nos levar a uma decisão precisa, mesmo se
dolorosa, porque implica um sacrifício, um distanciamento, uma renúncia.
7. O Reino se nos apresenta como
algo único, que não devemos deixar escapar. Não se trata, é bom entender, de
desprezar o resto. Trata-se de relativizar, redimensionar, subordinar ao que
foi descoberto. É impossível entrar no Reino sem passar por uma ruptura,
renúncia, abandono.
8. O sacrifício não é um fim em
si mesmo. Ele desemboca na alegria pela posse. E a alegria constitui o ponto
culminante da parábola. O discípulo de Jesus não é um que ‘deixou’, mas um que
encontrou. O cristão não é um que tende ao sacrifício, à renúncia. Mas um que
tende a uma alegria plena. E para isso está disposto a pagar o preço.
9. Quem melhor expressa tudo
isso é parábola da pérola preciosa. Na resposta à nossa vocação cristã, está
sempre uma fase de ruptura. Com a pérola na mão, lançamos um novo olhar sobre
as coisas. Concluímos ter feito um bom negócio.
10. Mas, a parábola pode ter um
final menos exultante. Aquilo que um dia consideramos precioso, pela força do
hábito, pode não ser hoje apreciado mais em todo o seu valor. A poeira do tempo
pode ter ofuscado o seu brilho original. Algo lento, progressivo, inexorável,
corrosivo vai se instalando...
11. Nosso olhar cansado da
opacidade produzida pelo hábito, vai em busca de outros brilhos e acabamos por
trocar a nossa pérola preciosa por bijuterias. E isso não diz respeito só ao
departamento de nossa fé. Está para um monte de coisas em nossa vida e em
nossas relações.
12. Trocamos a especificidade de
nossa vocação cristã por qualquer ideia nova ou idealismo em voga. Pelo
carreirismo, pela aparência, pelo aplauso, por vantagens econômicas, por uma
miserável satisfação. Nós podemos ser esse vendedor confuso que troca uma
pérola autêntica por pedaços de vidros coloridos. Por onde podemos
começar a nossa limpeza para recuperar o brilho perdido?
Pe. João Bosco Vieira Leite