(Dt 6,2-6; Sl 17[18]; Hb 7,23-28; Mc 12,28-34)
1. ‘Qual é o primeiro de todos os
mandamentos?’ A pergunta nasce de uma exigência particularmente sentida no meio
judaico. A grande preocupação de Israel é fazer a vontade de Deus, de modo que
a sua conduta fosse agradável a Deus.
2. Para isso existia a lei de Moisés,
os dez mandamentos, mas ao longo do tempo esse recinto sacro foi se enchendo de
outras normas ou observâncias, para que nenhum elemento da vida cotidiana,
nenhuma situação fugisse de rigorosa codificação de como se comportar em todas
as circunstâncias.
3. E assim ao que era importante se
misturava coisas de pouca importância. O equívoco era achar que tudo isso tinha
vinha do próprio Deus. Logo surgiu a necessidade de fixar uma hierarquia de
valor, de chegar a uma simplificação, de maneira a deixar claro o que era mais
importante e o que era menos.
4. De fato, antes de Jesus, alguns
rabinos já reconheciam a necessidade do amor a Deus e ao próximo como
realidades próximas e que a caridade era o melhor modo de agradar a Deus. Mas
permaneciam várias incertezas e sobretudo não se realizou de maneira explícita
essa ligação que Jesus fará entre os dois mandamentos.
5. Na reposta de Jesus ao escriba, ele
une dois textos do Pentateuco, um do Dt citado na 1ª leitura. Uma espécie de
profissão de fé com a qual todo israelita abria e encerrava o seu dia. E o
segundo texto vinha do Livro do Lv 19,18. O escriba queria saber qual o
primeiro mandamento, mas Jesus cita um segundo, tornando-os o mandamento maior.
6. Na citação de Jesus está a fé
monoteísta. O Deus único exclui toda espécie de ídolo. Na dependência d’Ele
está a fonte da liberdade. Ele não concorre com César. É o Deus não dos mortos,
mas dos vivos. E ainda exige um pertencimento e um amor total. Que se exprime
com todas as faculdades: coração, alma, mente, força.
7. Sem precisarmos analisar cada uma
dessas expressões, recolhamos a ideia de fundo que é a de totalidade, de
plenitude. É necessário amar a Deus com um amor que brota do centro da pessoa e
envolva todas as suas faculdades. A resposta do ser humano deve ser completa,
inteira.
8. Na menção ao amor ao próximo, é
importante levar em conta esse: ‘como a ti mesmo’. Nos vem sugerida a
possibilidade e o dever de amar a si mesmo (o que é obviamente diferente de ser
egoísta). Tem um sã amor a si mesmo que está na base do verdadeiro amor ao
próximo.
9. Não são poucos os cristãos ou
pessoas religiosas que são incapazes de aceitar e amar verdadeiramente os
outros porque radicalmente são incapazes de amar e aceitar a si mesmos.
10. O escriba aprova incondicionalmente
a resposta de Jesus. Compreende que a primazia desse duplo mandamento tem precedência
sobre todo o resto, até mesmo sobre o culto. E olha que estamos no próprio
Templo. Coloca-nos atento ao risco do legalismo que mede a relação com Deus tão
somente em observar normas.
11. O que diz o escriba faz eco a toda
tradição profética que compreendia que o culto, a adoração a Deus não pode
limitar-se as palavras e ao âmbito do Templo. Deve envolver o ser humano em sua
interioridade e nos seus precisos deveres para com o próximo.
12. Na surpreendente conclusão de
Jesus, ele percebe no escriba uma busca desinteressada da verdade, e uma
abertura para o Reino presente no próprio Jesus. Por fim, lembremo-nos que todo
aquele que tem a intenção de ser fiel a Deus, deve amar também o seu irmão, mas
não o poderá vivê-lo se não recebe esse dom de amar, do próprio
Deus.
Pe. João Bosco Vieira Leite