(Is 53,10-11; Hb 4,14-16; Mc 10,35-45).
1. No caminho que faz com os seus
discípulos, nem sempre é Jesus que vai à frente, às vezes são seus discípulos
que se antecipam, como fazem Tiago e João, que já pensam na glória de Jesus,
sem mesmo ter atravessado o caminho da cruz.
2. Mais uma vez Jesus é obrigado a
fazer a eles e a nós, retornarem. Não é lícito exorcizar a ideia do calvário,
transferindo-se logo para o Reino. Não é consentido remover a imagem da cruz,
substituindo-a por um lugar de honra. Ao discípulo não basta só compreender o
que o Mestre fala, é preciso estar com Ele no lugar justo, no momento justo.
3. Se a nossa obsessão é a de ‘chegar’,
Jesus nos diz que devemos ‘acompanhar’. Por vezes pretendemos que Deus assine
uma folha em branco. Ainda bem que Ele não entra em nosso jogo de astúcia, pois
nem sempre sabemos o que pedimos.
4. Na realidade somos nós que, na
oração, deveríamos assinar uma folha em branco e deixar que Deus livremente nos
faça conhecer. Paradoxalmente, temos mais a ganhar quando Deus não nos concede
o que ‘queremos que faça por nós’. O principal problema da oração está no
‘saber que coisa pedir’. Assim, o mais seguro seria deixar que ele nos peça.
5. Os discípulos querem um lugar de
honra, certamente com autoridade e segundo a visão hierárquica que têm do Reino
messiânico. A única coisa que Jesus assegura é a participação deles em seu
sofrimento e os convida a abandonar qualquer contabilidade de recompensa, pois
estão em boas mãos.
6. A renúncia a certas ambições
demonstra que confiamos naquilo que o Pai nos preparou. O discípulo é chamado a
viver no presente, deixando que Deus programe livremente o futuro. A recompensa
já está no próprio seguimento, no ser discípulo.
7. Jesus os faz vislumbrar rapidamente
a tirania reinante daqueles que se dizem chefes e parecem grandes no campo
político. Diante desse espetáculo de escala de poder e sucesso, os discípulos
devem tomar consciência que a opção de Jesus seria o caminho oposto e assim
denunciar o aspecto prevaricador do poder.
8. Jesus formula assim um projeto de
comunidade, caracterizado pelo anti-poder, no serviço e na dependência uns dos
outros. A tentativa de Jesus é abolir certa mentalidade, convertendo ‘libido do
poder’ na alegria de servir e assim eliminar o instinto de domínio de um ser
humano sobre o outro.
9. Para que as coisas ainda fiquem mais
claras, Jesus se apresenta como modelo, justamente Ele que, segundo a tradição
bíblica, foi dado ‘todo poder, glória e reinado’ (Dn 7,14). Jesus descontrói
essa imagem; seu poder é serviço, sua glória vem na humilhação e sua autoridade
régia é dar a própria vida.
10. Jesus apresenta um projeto de
comunidade sem poder, não sem autoridade. Mas tal autoridade é caracterizada
pelo serviço. É significativo que os três anúncios que Jesus faz de sua paixão se
concluem com o verbo ‘servir’. Seu caminho da cruz não é ‘sofrer’, mas
‘servir’, dando a vida. A grandeza está no dom de si. E este não tem limites.
Felizes seremos se compreendermos isso, nos dirá
Jesus.
Pe. João Bosco Vieira Leite