5º Domingo da Quaresma – Ano A

(Ez 37,12-14; Sl 129[130]; Rm 8,8-11; Jo 11,1-45)

1. Ao início do nosso evangelho somos informados sobre esse pequeno círculo de amizade que envolve Marta, Maria e Lázaro, este último se encontra enfermo. É certo que Jesus veio para todos, e mesmo assim cultivava o sentimento humano da amizade. Havia uma casa, de gente abastada, em Betânia, onde o Mestre se refugiava, às vezes, com certa intimidade.

2. Uma amizade tão profunda de não haver necessidade de muitas palavras: “Senhor, aquele que amas está doente”. Uma notícia sem muitos detalhes, mas suficiente para colocar Jesus ciente da situação e fazê-lo, quem sabe, pegar a estrada em direção ao conhecido vilarejo.

3. Uma amizade que autoriza Marta, depois da morte do irmão, a adotar uma linguagem que soa como uma reprovação: “Se tivesse estado aqui, meu irmão não teria morrido...”. Mas depois adicionar uma pitada de audácia: “Mas, mesmo assim eu sei que o que pedires a Deus, ele to concederá”. Aqui se misturam uma admirável certeza com sentimentos humanamente aceitáveis.                                        4. É como se ela dissesse: “Sei que és um verdadeiro amigo e posso confiar em ti, e sei que farás o que lhe for possível. E como gozas de uma relação privilegiada, única, com Deus, a tua presença será capaz de transformar o luto em festa”

5. E Cristo se agarra precisamente a essa declaração de Marta para conduzi-la a fazer uma explícita profissão de fé que torna possível o milagre. Como se vê, uma amizade que, sem perder nada da espontaneidade, confiança e sinceridade, sabe ‘reconhecer’, através do olhar da fé, a verdadeira identidade do amigo.

6. Há um particular nessa narrativa que nos revela o grau de intimidade e profundidade de participação com que Jesus viveu o sentimento da amizade humana. Dirigindo-se ao local onde o sepultaram e vendo a comoção geral, também ele chora.

7. Um Deus que chora a morte do amigo, que não esconde os próprios sentimentos, que não se envergonha de parecer humano demais, me convence tanto quanto aquele que chama de volta à vida quem estava morto. Essas lágrimas são um grande milagre. “Vede como ele o amava”, dirão alguns.

8. Mesmo com comentários adversos, Jesus se comove intimamente. Dois verbos que tornam o Mestre muito próximo de nossas angústias, da nossa consternação da dor, ao protesto contra a morte. Nem mesmo Cristo é de acordo com o mal, não aceita de olhos enxutos o sepulcro. Nem mesmo ele se resigna a separações tão brutais.

9. De um Deus que ama de maneira ‘tão humana’, podemos esperar tudo a favor do ser humano. É profundamente comovido que se aproxima do sepulcro. E é somente depois de ter estado em comunhão com nossa fragilidade é que Ele retoma o tom imperioso de comando: “Tirai a pedra!”.

10. Lhe advertem que já cheira mal. E aqui não é só um particular macabro da narrativa. Podemos colher um significado teológico que nos remete às páginas do Gênesis. O artista se encontra diante de sua obra prima deturpada, o ser humano havia escolhido a degradação, a morte, o pecado, desde aquele momento que deixou de dialogar com o próprio Criador, rejeitando o seu amor.

11. No texto do Gênesis Deus havia contemplado sua criação e concluía que era boa e bela. Mas aqui ela cheira mal. São dois opostos extremos. O itinerário percorrido pelo ser humano ao longo da estrada da fuga, da desobediência. Dos espaços sem medidas do Éden à prisão do sepulcro.

12. Na conclusão da narrativa Jesus exclama com voz forte: ‘Lázaro, vem para fora!’. Esse mesmo grito se dirige a nós. Cristo não se resigna aos nossos sepulcros, à nossa coabitação com a morte, às nossas escolhas de morte. Ele nos provoca, literalmente a ‘virmos para fora’.

13. Fora da prisão em que nos fechamos voluntariamente, acomodando-nos a uma vida fictícia, empobrecida de ideais. Virmos fora de horizontes sufocantes. Uma voz que nos convida a caminhar, tirando fora os lençóis que nos envolvem.

14. A ressurreição começa quando, obedecendo ao seu comando, decidimos vir de encontro à luz, à vida. Quando permitimos que o nosso ser mais autêntico se revele, abandonando as máscaras e reencontrando a coragem do nosso rosto ‘original’. É intolerável para Cristo, que fixemos nossa morda num sepulcro-prisão, antes de haver saboreado o gosto da vida.

 

Campanha da Fraternidade 2023 – Texto Base

   A fome nos desafia e desinstala. É preciso agir! Não é possível ficar parado diante do grito da realidade brasileira e do mandamento de Jesus. É a dimensão social da fé que exige de nós engajamento na busca de soluções eficazes para o drama da fome. A realidade da fome chega ao coração do Bom Pastor e Ele mobiliza seus discípulos missionários para uma ação pontual que resolva aquele problema, não a partir da lógica do dinheiro ou da indiferença, mas a partir da lógica de Jesus e do seu Evangelho.

   É esta lógica que motiva a nossa Quaresma, que faz com que nos dediquemos ainda mais à frequente celebração da Eucaristia, à escuta atenta da Palavra e aos exercícios da oração, do jejum e da esmola. Todas as experiências nos recordam que o pão não é meu, o pão é nosso! É nosso quando celebramos eucaristicamente, quando dele nos alimentamos na Leitura Orante da Bíblia. É nosso quando rezamos como Jesus nos ensinou e é nosso mesmo quando o renunciamos no jejum para partilhá-lo na esmola. O motor do nosso agir não é outro senão a mística do seguimento de Jesus, no qual a solidariedade nasce da espiritualidade, do encontro verdadeiro e transformador com o Deus do Reino, Pai nosso, e com o Reino de Deus. “O pedido que repetimos em cada Missa: ‘O pão nosso de cada dia nos dai hoje’, obriga-nos a fazer tudo o que for possível, em colaboração com as instituições internacionais, estatais, privadas, para que cesse ou pelo menos diminua, no mundo, o escândalo da fome e da subnutrição que padecem muitos milhões de pessoas, sobretudo nos países em vias de desenvolvimento” (Sacramentum Caritatis n. 91).

Pe. João Bosco Vieira Leite