(2Rs 5,9-14; Sl 31[32]; 1Cor 10,31—11,1; Mc 1,40-45).
1. Marcos nos narra a cura de um
leproso com seu estilo enxuto, e com extrema simplicidade e naturalidade, como
se tratasse de um acontecimento que entra na normalidade das coisas. Mesmo
sendo um fato de natureza prodigiosa, este anuncia qualquer coisa de
absolutamente nova e provocativa.
2. Para entendermos, é suficiente que
tenhamos presente a mentalidade hebraica no que se refere a doença da lepra
ainda vigente no tempo de Jesus: a lepra era a forma mais grave de impureza
cultual. A pessoa era tida como pecadora pública e punida por Deus, mantida à
distância.
3. Mas o leproso do Evangelho vem na
contramão da norma e se aproxima de Jesus e faz a sua súplica. E Jesus,
passando por cima da prescrição, cheio de compaixão, o cura.
4. Recuperar-se da lepra era como
ressuscitar dos mortos, algo que só Deus poderia realizar, mas também indício
de tempos novos, da vinda do Messias. Em Cristo, Deus age e realiza o seu
desígnio de salvação da humanidade. Mas, por que essa narrativa nos é
apresentada?
5. Para refletirmos sobre a divindade
de Jesus e sua realidade messiânica confirmada através dos milagres? Pode ser,
pois Marcos usa muito tais elementos para revelar a divindade de Jesus e
colocar crentes e não crentes diante da sua bondade e para que acolhamos sua mensagem
de salvação.
6. Mas para além desse fato que
confirma a nossa fé em Jesus, está a intenção da Igreja de fazer calar o
contexto histórico e nos levar a refletir sobre a atitude de Jesus e o nosso
cotidiano. Olhar o estado de humilhação e de marginalização em que se
encontrava esse pobre homem e da legislação que pesava sobre ele.
7. Poderíamos nos indignar com essa
visão obscurantista e assumirmos a posição de achar que eram coisas de um outro
tempo, inconcebível nos dias atuais. Mas sabemos que as vítimas de exclusão ou
marginalização fazem parte de qualquer tempo da história e o nosso não é
diferente.
8. Talvez tenhamos mais situações que
em outros tempos, que tocam pessoas e situações: o que não serve ou não rende,
vem colocado à parte e desse ou disso se mantem uma certa distância. Uma
mentalidade à qual vamos nos acostumando. Intolerância é também um fenômeno de
marginalização.
9. Nesse curto episódio de Marcos,
Jesus provoca aquele homem a contestar os erros ou carências de uma legislação
que não considera os mais débeis. O provoca a derrubar os muros da divisão
entre as pessoas. Nos ensina a estender as mãos a quem sofre no corpo e no
espírito e não ser-lhes indiferente.
10. Para que nosso discurso não fique
assim tão abstrato ou demagógico, pois sabemos que muitos gritam por justiça em
nosso mundo. O evangelho nos convida não só a gritar contra as injustiças, mas
a converter-nos ao modo de agir de Cristo, e a mostrar com gestos concretos
nossa conversão.
11. Não podemos mudar o mundo, bem o
sabemos, mas eliminemos, ao menos, algumas formas de marginalização que estão
em torno a nós e até mesmo provocadas por nós, em nossa convivência com os
outros e na relação com as situações de marginalização em nossa sociedade,
para, quem sabe, mudarmos um pouco a direção de nossa vida e de outas vidas...
Pe. João Bosco Vieira Leite