10º Domingo do Tempo Comum – Ano A

 (Os 6,3-6; Sl 49[50]; Rm 4,18-25; Mt 9,9-13)

1. Esse relato que acompanhamos compreende a história de um chamado, uma refeição e uma lição. Esses três elementos formam uma unidade coerente que tem como objetivo precisar o significado e os destinatários da missão de Jesus.

2. O chamado se situa em Cafarnaum e diz respeito a Mateus, cuja profissão era de cobrador de impostos. Com todas as implicações que já conhecemos. Onde há tarifas, há sempre um largo espaço para ganância e a possibilidade de fácil ganho.

3. Sua banca ocupa um lugar estratégico na estrada comercial para Damasco. Seu serviço beneficiava o tetrarca Herodes, mas também os romanos. Mas sua profissão, na mentalidade comum era o equivalente a ‘pecador’.

4. Os judeus evitavam certas ocupações por considerarem uma desonra. Aqui entram os pastores, os vendedores ambulantes e também os cobradores de impostos ou publicanos. Além de serem tratados como pecadores se viam privados dos seus direitos civis. Seus serviços eram considerados desonestos, o que impedia o conhecimento da Lei.

5. O relato da vocação segue o esquema comum: Jesus passa, vê o indivíduo, o escolhe e chama: ‘Segue-me’, ou seja, prenda-se a mim. A resposta de Mateus vem no ‘levantando-se’ e ‘seguindo’ a Jesus. Como sempre, o chamado implica uma separação, deixar algo ou alguém. Lhe coloca em movimento, num itinerário surpreendente e imprevisível.

6. No caso de Mateus há uma característica irrevogável. Que não foi o caso dos pescadores, que sempre voltavam às suas redes e barcos. Ele enfrenta o risco do seguimento, abandonando suas seguranças. Sua vida é transformada por uma palavra, um convite. O desequilibra para colocá-lo na busca de uma nova harmonia.

7. A refeição vem assinalada pela presença de outros pecadores, cobradores de impostos. Jesus exige a renúncia, mas não corta as raízes da pessoa. Se pergunta: na casa de quem isso acontece? Não importa. Cristo é o protagonista, é Ele quem convida. Aqui importa os convidados. Estamos em outra mesa.

8. O encontro com Cristo não estabelece somente uma relação pessoal com Ele, mas põe em relação com os irmãos. A refeição é sinal de uma dupla comunhão. Mas alguém torce o nariz; seu comportamento se torna escandaloso para aqueles que dividem o mundo de modo rigoroso em duas partes: os justos e os pecadores.

9. Os fariseus de todos os tempos estão sempre aparte, observando as coisas à distância. Permanecem em seus lugares, em suas restritas visões. Para entender é preciso vir fora e entrar no mundo do outro. Ver as coisas a partir de dentro. Julgar participando, observar comprometendo-se.

10. Cristo, ao contrário, veio ao encontro do ser humano não pretendendo manter distância, mas participando totalmente da nossa condição. Para sentar-se à mesa com Cristo é preciso deixar seu posto de observação privilegiado, somente misturando-se aos demais começaremos a entender alguma coisa.

11. Ao fariseu também é possível a conversão. Depende dele, colocar-se à mesa com os demais. Eles perguntam aos discípulos, mas é Jesus que explica a todos, pois é uma resposta que interessa a todos. Jesus articula sua resposta em três frases progressivas.

12. Cita um provérbio, buscando a sabedoria popular. Cita o profeta Oseias, aplicando a sabedoria bíblica e termina com o paradoxo evangélico: ‘eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores’. Assim revela sua identidade e missão. Os pecadores, os rejeitados da sociedade do seu tempo podem nos ensinar alguma coisa sobre Jesus.

13. Fica a pergunta: de que parte nos colocamos? Não é que os justos venham excluídos. Mas se excluem na medida em que se acham justos de modo definitivo, que se convencem que nunca precisaram de médico e resistem à solidariedade com os pecadores. Um médico nunca vem em nossa casa para uma visita de cortesia ou para assegurar que estamos bem. Se o vemos chegar, é porque não estamos bem, mesmo sem nos darmos conta.

14. Uma última pergunta: Será que nós, como os fariseus, não hesitamos de sentar-se à mesa, torcemos o nariz, por que não é de nosso gosto o prato da misericórdia servido por Cristo?

Pe. João Bosco Vieira Leite