Pentecostes – Missa do Dia

(At 2,1-11; Sl 103[104]; 1Cor 12,3-7.12-13; Jo 20,19-23)

1. Certamente já nos ocorreu de ver pessoas empurrando um carro e um motorista tentando fazer o mesmo funcionar. Esses tentam imprimir certa velocidade para que o motor venha a funcionar. Com muita insistência e cansaço eis que inesperadamente ele volta a funcionar. Um alívio para todos.

2. Assim podemos também imaginar a vida cristã. Se vai adiante aos empurrões, com cansaço, sem grandes progressos. Esquecidos, muitas vezes, que temos a disposição um motor potentíssimo – a ‘força do alto’ – que espera só ser colocado em uso. A festa de Pentecostes quer nos ajudar a descobrir esse motor e como colocá-lo em ação.

3. Escutando a 1ª leitura e o evangelho podemos ter a impressão de uma aparente contradição. Lucas fala da vinda do Espírito em Pentecostes, uma festa judaica, cinquenta dias depois da ressurreição, João nos fala de um sopro do Espírito naquela mesma tarde do domingo de Páscoa. Temos dois Pentecostes diversos?

4. Em certo sentido sim; mas as duas narrativas não se excluem, mas se integram. São duas maneiras diferentes de apresentar a função do Espírito que são igualmente válidas. Lucas vê o Espírito Santo como princípio de unidade e universalidade da Igreja e como força para a missão, por isso temos pessoas de diversas nacionalidades.

5. Para João, o Espírito é o princípio de vida nova que brota da morte de Cristo, por isso acentua sua manifestação no dia mesmo da Páscoa. Poderíamos dizer que João nos diz de onde vem o Espírito: do lado aberto de Cristo; Lucas nos diz aonde nos leva o Espírito: até os confins da terra.

6. Mesmo os símbolos usados para falar do Espírito Santo são diferentes. Mas ambos nos remetem ao significado da palavra hebraica ruach: vento, sopro ou suspiro. Lucas prefere o vento que coloca em relevo a força do Espírito Santo. João conhece esse significado do vento, mas privilegia a dinâmica do sopro, numa referência ao hálito que deu vida a Adão.

7. Mas voltemos a essa festa judaica de Pentecostes onde Lucas situa a vinda do Espírito. Ela tem vários significados ou tradições atreladas, mas no tempo de Jesus ela estava ligada à entrega das tábuas da Lei no monte Sinai e a aliança estabelecida entre Deus e seu povo.

8. Assim, Lucas quer nos indicar que o Espírito Santo é a nova Lei espiritual que se origina da nova e eterna aliança realizada em Cristo. Uma lei escrita não mais em pedras, mas no coração. Diferentemente do temor que dominava a vivência da Aliança no Antigo Testamento, somos chamados a viver a nossa fé por íntima convicção e por atração. Deus é pai e não patrão.

9. Em 1967 um grupo de pessoas fez uma nova experiência de Pentecostes e deu início ao movimento de Renovação Carismática Católico, que nos ajuda a entender a diferença entre os dois modos de viver a fé.

10. Para concluir lembro de uma história que tem uma versão bastante cômica e adaptada pelo Pe. Leo, que nos fala de uma família de italianos que ao início do século XX viaja para os Estados Unidos levando consigo para a viagem pão e queijo, pois não tinham dinheiro para pagar o restaurante do navio. Com o passar dos dias e das semanas, o pão vai mofando e o queijo se estragando. O filho, a certa altura, já não suporta mais aquilo e começa a chorar. Os pais fazem um esforço e buscando o pouco dinheiro que tinham lhe dão para uma refeição no restaurante. O filho vai, come e volta aos seus pais todo em lágrimas. Os pais não entendem porque ele chora, já que teve a oportunidade de uma boa refeição. Ele lhes responde: “Choro porque uma refeição ao dia no restaurante já estava inclusa no bilhete de passagem, e nós ficamos comendo pão e queijo todo esse tempo”.

11. Muitos cristãos fazem a travessia da vida a ‘pão e queijo’, sem alegria, sem entusiasmo, quando poderia ter a cada dia, espiritualmente falando, todos os bens de Deus que estão ‘inclusos’ no ser cristão: a certeza do amor de Deus, a coragem que dá a sua palavra, a alegria que vem da experiência do Espírito e da comunhão com os irmãos, tudo resumido e oferecido a nós concretamente no banquete da Eucaristia.  

12. O segredo para experimentar esse ‘novo Pentecostes’ se chama desejo! É a faísca que acende o motor que falávamos ao início. O próprio Lucas nos diz que Deus está disposto a dar o Espírito Santo a quem o pedir (Lc 11,13). Peçamos, portanto, como insistentemente nos propõe a liturgia de hoje. 

Pe. João Bosco Vieira Leite