(Gn 2,18-24; Hb 2,9-11;
Mc 10,2-16)
1. O tema central da liturgia da palavra nesse domingo é a
vida a dois e o projeto comum que Deus sonhou para o homem e a mulher. Tudo
começa com o olhar para aquela antiga história da criação; uma vez que tudo
havia sido criado e o homem coroava, por assim dizer, a criação divina; o autor
sagrado se dá conta de que algo está faltando.
2. Ele entende que o ser humano não foi feito para a
solidão. Toda a criação ao seu redor é bela e o serve, mas não é igual a ele,
não interage com ele. A criação da mulher tem como fim tirar o homem de sua
solidão. O destino de ambos é encontrar-se, dialogar, completar-se
reciprocamente. A felicidade de um casal depende do preenchimento desses
espaços.
3. Ser uma só carne transcende o campo da sexualidade, do
mero estar juntos, para chegar ao terreno de um projeto comum, sem competições
e no amor recíproco. E poderíamos elencar aqui várias situações da vida a dois
onde a solidão não foi de fato ainda superada.
4. A relação homem e mulher vêm continuamente repensada em
nossa sociedade e em muitas situações que conhecemos ela ainda está longe de
responder ao que Deus pensou e desejou. Refletir sobre as intuições do autor
sagrado pode nos levar à mesma admiração de Adão: “Desta vez sim, é osso dos
meus ossos...”. A gratidão a Deus por nos ter tirado da solidão seria cuidar
dos que nos foi confiado.
5. A carta aos hebreus nos acompanhará neste final de ano
litúrgico, não trata de questões práticas e diretas como Tiago, mas aprofunda o
mistério da pessoa de Jesus. No pequeno trecho que nos é oferecido transparece
um pouco do mistério de sua encarnação, nos diz de sua grandeza e ao mesmo
tempo do quanto viveu de nossa própria vida para nos guiar nesse caminho de
comunhão com Deus, fazendo-nos seus irmãos.
6. A questão do divórcio no tempo de Jesus é colocada em
discussão pelos fariseus. Para Marcos, entender a exigência da fidelidade
conjugal, absoluta e incondicional depende de colocá-la na ótica do amor de
Cristo, na lógica do próprio dom da vida.
7. O problema não se resolveu no tempo de Jesus, nem no
nosso. Moisés apenas tentou regularizar uma situação de fragilidade que deixava
a mulher à mercê do homem. Ontem e hoje, o convite de Jesus é reler o que
estava escrito no princípio. A separação é apenas um atestado destruidor da
obra de Deus.
8. Os discípulos ficaram também embaraçados com a resposta
de Jesus, e nós também ficamos cada vez que deparamos com o fracasso de uma
relação e a exigência de Suas palavras. Mas isso não nos faz juízes dos outros.
A meta proposta por Jesus não é pequena, mas depende do tempo de cada um
compreender o seu significado e valor.
9. A imagem da criança ao fim do texto nos desafia a descer
de nossa própria lógica e sabedoria e deixar-nos questionar pelas palavras de
Jesus. Ser criança é deixar-se penetrar por uma sabedoria nova, aquela de Deus
que fez Adão e Eva também crianças, mas que aos poucos perderam de vista o
paraíso que Deus sonhou para eles.
Pe. João Bosco Vieira Leite